O assassinato do servidor da Funai Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips no Vale do Javari (AM) escancarou o alerta que precisa ser ouvido pelas autoridades locais da Amazônia com relação à insegurança pública provocada por vários tipos de criminosos, que usam nosso Estado para explorar riquezas, grilar terras, derrubar florestas, aliciar menores, vender drogas e matar impunemente nossa gente em nome da ilegalidade.
Na região, seja no Amazonas ou no Pará, a dinâmica criminal inclui organizações criminais, principalmente as de base prisional, hoje com peso significativo nos indicadores de violência. Os dados abaixo fazem parte do documento chamado “Cartografias das violências na região amazônica: relatório final”, divulgado em fevereiro deste ano pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Rotas da droga no Pará
No Pará, as rotas constituem uma área de trânsito da droga em direção aos mercados nacionais e internacionais, visto que por meio do rio Amazonas as redes integram a cidade de Santarém, mas o destino da droga é a capital Belém. Pelo rio Amazonas há também uma integração pelo rio Xingu, através de Altamira, que se tornou um grande entreposto da droga com a presença das facções criminosas. Por fim, a rede se completa através da conexão rio Amazonas-rio Tocantins por meio das cidades de Cametá, Abaetetuba, Barcarena, Moju e Igarapé Miri. Belém e Barcarena se destacam como importantes pontos de distribuição da droga em direção à Europa.
Pela rodovia Cuiabá-Porto Velho se dá a ligação das redes que partem da Bolívia na região de fronteira com Rondônia e a interação de Mato Grosso com o oeste do Pará por meio da BR-163 (Cuiabá/Santarém) que se integra à rodovia Transamazônica, rio Xingu e rio Amazonas, conectando a região de Altamira. No Pará, há as interações que ocorrem a partir da Transamazônica, saindo de Santarém em direção a Belém e região nordeste do Estado. Há ainda a integração através das rodovias Belém/Brasília, Pará-Maranhão e Transcametá em direção a região Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil, além de expandir as rotas para o nordeste a partir do Maranhão.
Via aérea
Existem, também, rotas aeroviárias, onde narcotraficantes pagam pilotos de pequenas aeronaves que se encarregam de transportar a cocaína, seja atravessando as fronteiras em voos baixos, seja abastecendo as aeronaves já em território brasileiro para dar prosseguimento do transporte em direção às outras regiões. Desse modo, é comum na Amazônia a existência de pistas de pouso clandestinas que são construídas para receber a droga. Estas pistas de pouso, foram encontradas tanto em meio às florestas quanto em fazendas.
Facções
As cidades de Belém e Manaus constituem-se como duas importantes metrópoles regionais que historicamente sofrem com problemas de violência urbana relacionadas à presença de gangues, grupos de extermínio e tráfico de drogas, mas que foram agravados pela chegada das facções criminosas do Sudeste, sobretudo o Primeiro Comando da Capital (PCC) e Comando Vermelho (CV).
Com o crescimento do tráfico de cocaína na Amazônia, essas duas metrópoles ficaram em evidência nas disputas pelo controle do mercado da droga, pois constituem importantes hubs da interação espacial das redes na região para a fluidez da droga em direção aos mercados nacionais e globais. Não à toa, grupos regionais do tráfico de drogas começaram a se organizar para controlarem as principais rotas de distribuição e consumo na região.
No Amazonas
Em 2007, surge no Amazonas a Família Do Norte (FDN), facção regional nascida dentro do sistema penitenciário e que passa a exercer influência na região Norte do país. Ato contínuo, a FDN passa a controlar a principal rota da entrada de cocaína na Amazônia, a do rio Solimões, que sempre foi de interesse geoestratégico do PCC, por conectar a tríplice fronteira do Brasil, Colômbia e Peru. A FDN também buscou desenvolver outras atividades típicas da economia do crime como o tráfico de armas.
FDN x CV
Até 2017, a FDN e o CV eram aliados. Atualmente, os grupos são rivais, na medida em que o CV conseguiu controlar Manaus depois de uma longa guerra com a FDN. O início dos conflitos entre ambos ocorreu quando, em 2017, um grupo de integrantes da FDN tentou dividir as áreas de influência do mercado da droga em Manaus, fato que fez surgir um terceiro grupo, a “FDN pura”. Essa dissidência da FDN, segundo os relatos de policiais ouvidos pelo projeto, se aliou ao CV, que por sua vez já controlava as rotas do tráfico de drogas da Colômbia. Isso acabou por ampliar sua influência na região, mas também fez com que FDN e CV passassem a disputar o controle do mercado e das rotas da droga em Manaus e no Amazonas.
No Pará
No Pará, também em 2017, houve a criação do Primeiro Comando do Norte (PCN), facção aliada ao PCC paulista, que surgiu como estratégia deste último para ampliar sua influência dentro do sistema penitenciário da região Norte e, ao mesmo tempo, controlar o mercado e das rotas do narcotráfico em Altamira e Marabá.
Devido à prisão de vários membros do PCN, a facção teve pouco tempo de vida e logo foi diluída. Surgiu, também, o Comando Classe A (CCA) no pavilhão A do sistema penitenciário de Altamira, que viria a se tornar uma espécie de braço do PCC na região e se aliar a outras facções atuantes ali, a saber Bonde dos 13 (B13), IFARA (Irmandade, Força Ativa e Responsabilidade Acreana), Família Terror do Amapá e Primeiro Comando da Capital. Essas siglas mostram a conexão das facções dos Estados do Acre, Amapá, Pará e São Paulo.
PGN x Rex
Dois outros grupos atuam no Pará: a Primeira Guerrilha do Norte (PGN), pequena facção aliada ao PCC que surgiu no interior do Estado, na região da Colônia do Prata no município de Igarapé Mirim no nordeste do Pará; e a Equipe Rex, presente no bairro da Terra Firme, periferia de Belém.
No caso da Equipe Rex, assim como de outros pequenos grupos de expressão local, houve integração com o Comando Vermelho, que hoje tem grande influência na Região Metropolitana de Belém.
Fonte: Fórum Brasileiro de Segurança Pública