Por Talita Bedinelli, de Sumaúma
A Defensoria Pública da União (DPU) deu um prazo de 5 dias, que venceu na segunda-feira, 12/12, para que o IBGE explique quais providências irá tomar para garantir que todos os indígenas brasileiros sejam contados no Censo 2022.
SUMAÚMA revelou que populações de 3 etnias podem ser apagadas das estatísticas porque o órgão governamental não conseguiu os helicópteros necessários para chegar nas áreas de difícil acesso onde eles vivem. A não inclusão de todos os indígenas na contagem populacional pode causar um importante impacto em políticas públicas de saúde e educação destinadas a eles.
Em um documento datado de 7 de dezembro, a DPU, que tem entre as suas atribuições a defesa legal dos povos originários, recomendou que o IBGE realize “com a máxima urgência” a contratação de serviço de táxi aéreo adequado para assegurar o transporte da equipe e possibilitar o recenseamento de todas as comunidades indígenas dos povos Yanomami e Wajãpi, as duas comunidades afetadas.
Na Terra Indígena Yanomami também vivem os Ye’kwana, outra etnia cuja contagem ainda está incompleta. A estimativa do próprio IBGE é que 15 mil indígenas das três etnias correm o risco de ficar de fora das estatísticas. A recomendação da DPU é um passo inicial antes de se judicializar uma demanda. O IBGE deve explicar seu plano, com documentos comprobatórios.
A dificuldade de contratação dos helicópteros começou ainda no começo deste ano. O IBGE afirma em um documento obtido por SUMAÚMA ter tentado a ajuda da Fundação Nacional do Índio (Funai), da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), que possuem contratos com empresas de táxi aéreo nestas regiões, e do Exército, que tem aeronaves e faz o patrulhamento destas áreas na fronteira.
Exército e Sesai negaram ajuda. A Funai conseguiu fornecer parte das horas-voo necessárias, mas não todas. O órgão estatístico abriu, então, um processo de contratação de táxi aéreo por meio da modalidade de compra direta, pois não haveria mais tempo hábil de fazer uma licitação, segundo justificou. Este processo tramitou entre setembro e novembro. Em 28 de novembro, a AGU deu parecer contrário e recomendou que haja uma força-tarefa governamental para realizar a coleta dos dados.
Até o momento, no entanto, o IBGE não respondeu como pretende executar os trabalhos. A coleta do Censo 2022 começou em agosto e tem sua conclusão prevista para dezembro.
Tanto o território dos Yanomami (nos estados de Amazonas e Roraima), quanto o dos Wajãpi (no Amapá) são áreas que foram invadidas por garimpeiros nos últimos anos. Isso levou a um aumento de violências diversas, doenças e, consequentemente, ao incremento da mortalidade. Sem os dados completos do Censo não será possível fazer uma comparação com as informações coletadas em 2010, ano das últimas estatísticas gerais do IBGE.
Assim, não se poderá saber o que de fato aconteceu com essas populações na última década e qual o exato impacto das atividades criminosas. Não se saberá quantos indivíduos morreram e nasceram, quantos deixaram as aldeias, o que se perdeu da riqueza cultural e se o mercúrio usado pelo garimpo e que polui os rios pode ter criado um problema de saúde pública.
A falta de coleta dos dados é uma clara violação dos direitos dos povos indígenas, como reconheceu o próprio IBGE em documento a que SUMAÚMA teve acesso.
“Caso o Censo Demográfico 2022 não garanta a cobertura de todas as Terras Indígenas e, dentro delas, de todas as aldeias ou comunidades (…) [haverá] impactos na execução e no monitoramento da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, da Política Nacional de Gestão de Terras Indígenas e da Política Nacional de Educação Escolar Indígena”, ressaltou o documento assinado pela Diretoria de Pesquisas, Diretoria de Geociências e da Coordenação-Geral de Operações Censitárias do órgão, em 30 de novembro.
Procurado pela reportagem, o IBGE afirmou que está buscando alternativas legais para recensear a população indígena. “O IBGE segue comprometido a concluir e honrar a missão do Censo. Deixar de recensear parte dos povos indígenas nunca foi considerado”, explicou, por email. O órgão afirma que das 632 Terras Indígenas (TIs) do Brasil, a coleta do Censo foi feita, até 01 de dezembro, em 605 (95,73%). Em 382 delas foi totalmente finalizada e em 223 (35,28%) está em andamento, com dados parcialmente apurados. Em 27 TIs a coleta não foi iniciada.
Fonte: Sumaúma