Um dos principais catalisadores do desmatamento no país, o setor madeireiro é destaque do relatório “Os Invasores: quem são os empresários brasileiros e estrangeiros com mais sobreposições em terras indígenas”, recentemente publicado pelo De Olho nos Ruralistas. Com base nos dados fundiários do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), o estudo identificou pelo menos quinze grandes incidências de empresários do ramo madeireiro em Terras Indígenas (TIs) demarcadas pela Funai no Pará, Mato Grosso, Maranhão e Bahia.
A pesquisa mostrou que esses executivos compartilham um histórico de lobby nacional e internacional, defendendo a “sustentabilidade” do setor madeireiro enquanto suas empresas avançam sobre os territórios tradicionais.
Além da atividade madeireira, os setores de grãos, carne, açúcar, etanol e fruticultura são os principais responsáveis pelas sobreposições. Entre os grupos multinacionais ligados a fazendas incidentes em terras indígenas figuram Bunge, Amaggi, Bom Futuro, Lactalis, Cosan, Ducoco e Nichio. Bancos e fundos de investimento estão diretamente envolvidos na pressão econômica contra as TIs. Itaú (por meio da subsidiária Kinea) e Bradesco são os principais nomes da lista, seguidos por XP, Gávea Investimentos, IFC e Mubadala.
No Pará, as TIs mais afetadas de acordo com o levantamento são a Amanayé e Juruna do KM 17, localizadas nos municípios de Goianésia do Pará e Altamira, respectivamente.
Na primeira, está a Fazenda Dois Irmãos, com 2.489,56 ha de área sobreposta e cujo titular foi multado pelo Ibama por extração irregular de madeira em 2010 e 2014. E também a Fazenda Ribeiro, com 2.193,08 ha sobrepostos. Na Juruna do KM 17 se encontra a Fazenda Coringa, com área de 514,61 ha.
Dados de 2016 do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostram que entre 43% e 80% de toda madeira nativa extraída da Amazônia são obtidos de forma ilegal. Isso costuma significar que as toras tiveram origem em terras públicas, como Unidades de Conservação e territórios indígenas.
O impacto gerado pela exploração de madeira ilegal em comunidades tradicionais é devastador. Como já publicamos aqui no Pará Terra Boa, no território PAE Lago Grande, a incidência das madeireiras, cujos resíduos são despejados diretamente no rio da região, prejudica a população do Alto Arapiuns, que depende dessa água até para beber e pescar
Protesto premiado
Esses acontecimentos levaram o coletivo do Guardiões do Bem Viver a protagonizar um ato de resistência em agosto de 2022, que acaba de ser premiado com o Megafone de Ativismo 2023, na categoria de ação direta
Na ação, os jovens, juntamente às lideranças comunitárias das aldeias e comunidades da região do Arapiuns, saíram em rabetas, embarcações comuns na região, levando cartazes de denúncias e conscientização, que traziam mensagens como “o rio é nosso corpo, nosso sangue, nossa vida”. Cerca de 150 pessoas participaram da mobilização com barcos e palavras de luta, que marcaram esse ato pela Amazônia e seus povos.
“A gente já não pode mais tomar banho meio dia, por exemplo, temos que esperar anoitecer para a água estar mais fria. A quentura é imensa por conta do desmatamento. O plantio não é mais como era antes, ninguém mais sabe o tempo certo de colher, plantar e queimar. E tem pessoas que ainda acham que se chove hoje e amanhã está quente tudo está normal, mas não está”, defendeu Marlon Rebelo, integrante do coletivo Guardiões do Bem Viver.