Por Fabrício Queiroz
Uma mesa farta e cheia de variedades recepciona quem visita um imóvel amplo no bairro da Pedreira, em Belém. Farinha de Bragança, chocolate do Acaráçu, mel de abelhas nativas, óleos essenciais e farinhas à base de frutos típicos da Amazônia formam uma amostra da diversidade de produtos oriundos da agricultura familiar. Todos eles estão à disposição do consumidor no ponto da Rede Bragantina de Economia Solidária.
O local oferece uma ponte que facilita a comercialização da produção de cooperativas e associações de agricultores de 11 municípios do nordeste paraense, que congregam em torno de 580 famílias. Uma delas é a família de Macieli Furtado, de 21 anos, que ao lado dos pais e dos cinco irmãos trabalha com o cultivo de hortaliças, legumes e frutas totalmente orgânicos em Santo Antônio do Tauá.
“A gente não usa nada químico. O único produto que a gente usa é o adubo com esterco de galinha mesmo. Para nós, eles trazem uma renda boa e também traz mais saúde porque são alimentos do nosso consumo no dia a dia”, comenta a agricultora.
A cada semana, Macieli ou outro membro da família vem para Belém para participar do chamado “balcão da agrosociobiodiversidade” promovido pela Rede Bragantina. O evento funciona como uma feira, que movimenta o comércio no bairro e ajuda a promover a alimentação orgânica e o papel dos agricultores familiares na segurança alimentar e nutricional.
“É uma ajuda para poder vender os nossos produtos e também divulgar a agricultura orgânica. Isso fortalece o movimento do orgânico, até porque as pessoas ainda têm um certo preconceito por causa da aparência que é diferente do que está no supermercado. A gente acaba fazendo essa divulgação e explicando os benefícios dos orgânicos”, pontua Macieli Furtado.
Construção coletiva
A comercialização, no entanto, é só um aspecto das ações desenvolvidas pela Rede Bragantina. A iniciativa surgiu em 2009, fruto de um processo de construção coletiva que teve origem na Escola de Formação para Jovens Agricultores de Comunidades Rurais Amazônicas (ECRAMA).
Localizada na zona rural do município de Bragança, a escola visa contribuir com a educação para a vida e o trabalho no campo por meio de atividades voltadas à agrocecologia, à participação social e a formação multidimensional.
“A escola ECRAMA tem esse viés de formação dentro da linha informal, com cursos e formações para os agricultores e agricultoras da região dentro da linha de agroecologia e cidadania. São cursos que são feitos em módulos, com duração de 9 meses. Trabalhamos com a pedagogia da alternância, ou seja, tem essa interação entre o campo e a sala de aula, que proporciona a construção de conhecimento envolvendo a academia e os saberes populares”, explica a pedagoga, Lúcia Reis, uma das administradoras do ponto da Rede Bragantina em Belém.
De acordo com as coordenadoras, a criação do espaço tendo como princípio norteador a economia solidária foi uma estratégia encontrada para enfrentar os problemas de acesso ao mercado e baixa remuneração enfrentados pelos agricultores em virtude da ação de atravessadores.
Aliado a isso, a oferta de formação continuada e as parcerias estabelecidas com ONGs e instituições como a Embrapa ajudam na incorporação de tecnologias de trato da terra e beneficiamento dos produtos que chegam às prateleiras da loja.
“Esses produtos têm esse perfil diferenciado que não traz em si só um valor econômico, mas traz também uma subjetividade, a cultura e o território. Muitas vezes, os agricultores têm seus imóveis espremidos por conta do avanço do agronegócio e do latifúndio e, quando você fala nisso, tem a questão do combate ao uso do veneno e dos agrotóxicos. Mas por trás disso tem também a defesa do território e do ambiente, a guarda de patrimônio cultural e genético. Isso é biodiversidade”, ressalta Nazaré Ghirard, engenheira agrônoma e assessora técnica do projeto.
Para a Rede Bragantina, as principais conquistas do projeto são observadas nos ganhos coletivos proporcionados pela geração de renda e o fortalecimento da organização das cooperativas de agricultores.
“Os agricultores se sentem orgulhosos de perceber que eles estão exercendo a autonomia na gestão daquilo que eles têm e exercitando um comércio justo. Sem a figura do atravessador, eles podem levar os produtos para o processamento e o valor é negociável. É muito comum eles colocarem que a Rede Bragantina veio contribuir também para que eles valorizassem aquilo que eles tinham de produção e era desperdiçado e, hoje, se torna uma fonte de renda”, afirma Nazaré Ghirard.