Em Medicilândia, há um dos exemplos de sucesso do Pará na produção de chocolate. Esse mercado da cacauilcultura tem se mostrado uma boa oportunidade de trabalho para o produtor da agricultura familiar, bem como uma maneira de manter a floresta em pé, uma vez que é possível plantar o fruto em áreas já degradadas.
Com muito suor e dedicação, a marca Cacauway conseguiu se estabelecer hoje como uma das principais produtoras de cacau e chocolate do Estado. Mas isso não quer dizer que foi fácil chegar até aqui, com perspectiva de abertura de lojas no Maranhão, Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo.
Até 2019, a produção da marca batia 40 toneladas de cacau por ano. Hoje, esse número foi reduzido para 30, uma queda de 25% em razão da pandemia do novo coronavírus.
Além de produzir, industrializar e comercializar cacau, chocolate e alguns derivados, a marca também é uma cooperativa que reúne 32 produtores da agricultura familiar estabelecidos em áreas que variam de 4 a 15 hectares. Depois de 10 anos sem receber novos cooperados, a cooperativa está hoje à procura de novos membros.
Como nos contou Ademir Venturin, diretor da Cacauway, o segredo do bom chocolate é a seleção das melhores amêndoas. A partir daí, conta ele, é ser fiel à receita básica: leite, manteiga de cacau, massa de cacau e açúcar. “Tudo que colocar a mais, estraga”, diz.
Desde 2010, a cooperativa salta obstáculos. Um deles foi a carência de infraestrutura do Estado para escoar a produção.
“Olhe bem, dez anos atrás, não tínhamos internet boa, a energia elétrica era instável e não havia estrada asfaltada até Belém. Industrializar na Amazônia, a 1.000 km da capital, era para nem ter coragem. Tinha um slogan no passado que dizia: se trazer o pessoal para cá foi um erro, abandoná-lo é um crime. Foi uma ousadia muito grande na época”, lembra Ademir dos tempos em que a construção da Rodovia Transamazônica provocou o fluxo de trabalhadores do país inteiro para a região nos anos 1970.
Para se ter uma ideia das principais mudanças daquela época para cá, é preciso lembrar que a legislação permitia o desmate de 80% da área e preservação de 20% da floresta. Nos anos 1990, a permissão para desmatar foi reduzida para 50%. Só nos anos 2000, o produtor passou a obedecer a norma para preservar 80% e desmatar 20% da área de cultivo.
O apoio do governo por meio do fundo Funcacau foi essencial para a arrancada do negócio. Hoje, o fundo arrecada de R$ 10 milhões a R$ 12 milhões por ano para custear a cadeia do cacau no Pará. “Em 2009, havia uma crise, em que o governo dizia que não poderia oferecer o dinheiro para empresa privada, tinha que ser cooperativa”, conta Ademir.
Segundo ele, foi preciso vencer uma barreira cultural do pequeno produtor para que a cooperativa ficasse de pé. “A cooperativa é uma empresa que aposta no empreendedorismo. O produtor é um trabalhador, ele tem medo e espera muito num prazo curto. Mas para acontecer, é preciso que o produtor faça acontecer”, disse.
Só a partir de muito trabalho de conscientização, de pesquisas sobre o cacau, de busca por assistência técnica ao produtor, de parcerias do setor com entidades privadas, como o Sebrae, é que a cooperativa conseguiu virar o jogo.
“Trabalhamos de graça no começo. Fui forçado a aprender de tudo. Você não tinha nenhuma faculdade que te ensinasse a plantar o cacau. Todas as dificuldades nos forçaram a acreditar nesse horizonte que respeitasse o meio ambiente, com persistência e tentando sonhar que a Amazônia poderia ser a solução para o agricultor familiar, e não para os grileiros e garimpeiros”, afirmou.
Ademir se orgulha de ter aberto um caminho para novos produtores de cacau. O Pará conta hoje com cerca de dez marcas de chocolate. “Com muito trabalho de conscientização, conseguimos convencer o produtor familiar de que ele é capaz de produzir o melhor chocolate do mundo. Não tem nenhum como o daqui”, disse.
Raio X
O Pará é o maior produtor de cacau do Brasil. Metade do consumo do produto no país vem do Estado. Em 2020, a produção foi de 144,6 mil toneladas. Cerca de 30 mil produtores fazem parte da cadeia da cacauicultura no Estado, com liderança dos municípios de Medicilândia, Tucumã e Tomé-açu. Motivo de orgulho local, o Pará passou a Bahia na produção do produto em 2018.
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