A boa notícia sobre uso dos fitoterápicos da Amazônia para combater acidente vascular cerebral (AVC) vem da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA). O professor Walace Gomes, vinculado ao Instituto de Saúde Coletiva (Isco), está à frente de pesquisas bem-sucedidas, há dez anos, sobre o desenvolvimento de uma substância da flora amazônica, chamada neuroprotetor, que, ao ser ingerida ou injetada no paciente, diminui a expansão da lesão no cérebro, contribuindo para a redução das sequelas neurológicas.
Em estudos realizados em laboratório do Instituto de Ciências Biológicas da UFPA, e agora no Isco da UFOPA, o pesquisador encontrou pelos menos três neuroprotetores naturais derivados da flora amazônica. Uma das principais fontes é o gergelim preto. O outro é o cipó pucá.
Essas descobertas fazem com que a UFOPA seja protagonista nessas pesquisas, podendo ser ela a primeira do mundo a desenvolver um fitoterápico neuroprotetor derivado da flora amazônica. Isso porque não existem neuroprotetores no mercado, para uso em humanos, com exceção dos chamados trombolíticos, que dissolvem coágulos sanguíneos, mas podem prejudicar o cérebro por causa dos efeitos colaterais que provocam no paciente.
O pesquisador assegura que os testes clínicos em humanos se iniciarão em 2022.
“Após AVC isquêmico experimental em ratos, constatamos que estes neuroprotetores naturais diminuem a lesão e as sequelas neurológicas em ratos adultos. Desenvolvemos a startup Neuroprotect, que foi selecionada no Startup Pará, Inova Amazônia (Sebrae) e programa Emerge Amazônia, que negocia atualmente com empresas farmacêuticas, para realização de estudos clínicos em humanos, das ações de um fitoterápico neuroprotetor derivado de produtos da flora amazônica, ou seja, a cura pode vir da rica biodiversidade amazônica”, explica.
Como pesquisador da área, o doutor Walace ressalta a preocupação com o poder público, que deve investir em unidades de atendimento ao AVC, altamente equipadas, permitindo o uso de procedimentos modernos, como a trombectomia, para o AVC isquêmico, o tipo mais comum de AVC.
Fatores de risco
Os fatores de risco para desenvolver um AVC podem ser classificados em modificáveis e não modificáveis.
Por exemplo, ter idade avançada, ser do sexo masculino e ter história familiar de incidências de AVC são fatores não modificáveis, ou seja, nada se pode fazer a respeito. O risco de uma pessoa idosa desenvolver um AVC é maior que o de pessoas jovens, apesar de estes últimos também serem acometidos. Homens têm mais AVCs que mulheres, e quem tem história de AVC na família possui um risco maior de contrair a doença.
São fatores de risco modificáveis: a hipertensão arterial (pressão alta), fibrilação arterial (o coração contrai de forma desordenada), sedentarismo, altos níveis de colesterol (gordura) no sangue, tabagismo (fumo), ser diabético, além de outros fatores.
“Isso significa que uma mudança nos hábitos de vida pode diminuir o risco de desenvolver um AVC. Portanto, uma pessoa com hipertensão deve controlá-la adequadamente. O sedentarismo deve ser substituído por exercícios físicos regulares, como caminhar diariamente 40 minutos por dia em ambientes naturais. Esse hábito, além de diminuir o risco de AVC, impacta positivamente na saúde mental. Deve-se evitar o fumo e o uso excessivo de bebidas alcoólicas”, alerta o pesquisador, ao enfatizar que a alimentação deve ser saudável, com diminuição de dieta calórica, rica em gordura e carboidratos. Deve haver substituição por uma dieta mais saudável, rica em frutas e vegetais, peixe e carne grelhada.
O que é AVC
O AVC é um problema em vasos sanguíneos do cérebro, principalmente artérias. Ele pode ser dividido em isquêmico, quando o vaso é obstruído por um trombo (uma massa estacionária), ou hemorrágico, quando o vaso se rompe.
O AVC isquêmico é o mais comum, perfazendo mais de 80% dos casos. Os sintomas de um AVC são súbitos e dependem do local do cérebro que é afetado. No AVC, o sintoma ocorre no lado oposto ao hemisfério cerebral afetado, o seja, se o mesmo ocorrer no lado direto do cérebro, o lado esquerdo do corpo será afetado.
Esses sintomas podem incluir cefaleia (dor de cabeça), paralisia muscular, dormência, confusão mental, problemas na fala (disartria) e sintomas mais complexos como esquecer o significado de um objeto, como um copo (agnosia), perder a capacidade de realizar atos motores usuais como abotoar a camisa (apraxia), ou problemas na fala ou linguagem (afasias).
O termo AVC refere-se a sintomas que persistem por 24 horas ou mais. Se um paciente apresenta sintomas que persistem por poucas horas, diz-se que o indivíduo teve um acidente isquêmico transitório (AIT), o que, aliás, é um importante fator de risco para desenvolver um AVC.
As terapias para AVC são limitadas. Pacientes diagnosticados com AVC isquêmico que chegam ao hospital em até 4 a 6 horas após o surgimento dos sintomas podem ser tratados com um trombolítico intravenoso (ALTEPLASE) para dissolver o trombo e restaurar o fluxo sanguíneo.
Infelizmente, o trombolítico é pouco usado por ter uma janela terapêutica estreita. A grande maioria dos pacientes chega várias horas e mesmo dias após o início dos sintomas de AVC. O uso tardio do trombolítico para AVC isquêmico pode induzir um evento grave: o rompimento do vaso sanguíneo (transformação hemorrágica).
Após um AVC isquêmico ou hemorrágico, se não houver morte, o indivíduo pode desenvolver sequelas parciais ou permanentes após a expansão da lesão inicial e/ou aumento da morte de neurônios. Outra abordagem para o AVC isquêmico, não disponível no nosso município e mesmo no nosso estado, é a trombectomia, em que o neurocirurgião remove o trombo cirurgicamente nas primeiras horas após o AVC.
Dr. Walace diz que “essa abordagem já foi aprovada em humanos, mas necessita de uma unidade de atendimento ao paciente com AVC altamente equipada e médicos altamente treinados. Essas sequelas motoras e sensoriais podem ser diminuídas com abordagens fisioterápicas adequadas”.
Estima-se que, durante a vida, uma em cada seis pessoas terá algum tipo de AVC.
No Brasil, cerca de 100 mil pessoas têm um novo AVC anualmente. São 800 mil pessoas por ano nos Estados Unidos (EUA) e 1,5 milhão na China. Metade das pessoas pode morrer, enquanto que a outra metade pode ficar com sequelas permanentes, tendo suas vidas esfaceladas do ponto de vista neurológico, familiar e profissional. Inúmeras pessoas com sequelas pós-AVC dependem de cuidado rigoroso e grande aporte financeiro do poder público.
Com o avanço das pesquisas na UFOPA para desenvolvimento de um neuroprotetor natural, a partir de produtos retirados da flora amazônica, aumenta a expectativa de centenas de pessoas que ainda podem evitar a doença.
Fonte: Albanira Coelho, UFOPA