Já ficou provado que produzir riquezas da biodiversidade amazônica traz mais dinheiro para o produtor do que a pecuária, como já nos informou aqui o professor da Universidade Federal Rural da Amazônia, Antônio Cordeiro de Santana.
Embora traga muitos ganhos aos grandes criadores em nosso Estado, o mercado da pecuária tem uma brecha nociva à terra boa do Pará representada pelos fornecedores indiretos que comercializam carne bovina de áreas griladas e, consequentemente, desmatadas. Hoje em dia, há vários mecanismos para rastrear de onde vem essa carne, mas grandes frigoríficos ainda trabalham com esses atravessadores ilegais. O paraense sabe: primeiro se promove a grilagem, depois o desmatamento e, em seguida, coloca-se gado na propriedade grilada. A partir daí, a carne viaja.
Esse caminho da carne tem um “ponto cego” apresentado em recente estudo da revista Science Advances, que analisou dados de comercialização de commodities como soja, carne bovina, cacau e óleo de palma, com foco naquelas produzidas em países com florestas tropicais, como Brasil, Indonésia, República Democrática do Congo e outros países da costa oeste africana. A pesquisa foi publicada no dia 29 de abril.
O que diz o estudo?
De acordo com a análise, cerca de 40% das commodities que são produzidas em áreas de pressão sobre florestas tropicais, como o Pará, são adquiridas pelos grandes compradores por meio de terceiros, o que dificulta o rastreamento da origem do produto e abre caminho para que mercadorias como soja e carne bovina produzidas em áreas desmatadas ilegalmente sejam comercializadas sem qualquer restrição.
Esses “terceiros”, no caso, são as chamadas traders. Elas que canalizam a produção local para o mercado externo. A posição desses intermediários – ou traders – é estratégica para o funcionamento desse mercado. A maior parte dessas commodities é vendida aos clientes por essas empresas, que compram diretamente dos produtores.
‘Lavagem de animais’
O estudo se refere às traders, mas é importante salientar que a carne de área desmatada é ainda distribuída no Brasil por outros agentes que fazem o mesmo serviço que algumas traders: pecuaristas dentro do nosso Estado que comercializam a carne bovina com documentação irregular.
Esse tema foi abordado já pela Coalizão Brasil, um um movimento composto por mais de 300 representantes do setor privado, setor financeiro, academia e sociedade civil.
Além da completa falta de informação a respeito dos locais de criação e proprietários pelos quais o animal adquirido passou, por limitarem-se ao monitoramento de seus fornecedores diretos e se utilizarem apenas da GTA (guia de trânsito animal), que lhes é enviada como garantia da última origem dos animais, os frigoríficos estão sujeitos a efetuar compras associadas a práticas como a triangulação de animais e documentos, também conhecidas como “lavagem de animais”.
A triangulação é um processo simples através do qual as fazendas que não se enquadram nas políticas de compras dos frigoríficos (as denominadas “propriedades sujas”) comercializam animais utilizando a GTA (guia de trânsito animal) de um imóvel rural “limpo” e, assim, seus animais se tornam aceitáveis pelos compradores.
EUA de olho
Por falar em commodities, uma reportagem interativa no Washington Post ressaltou como o consumo de carne bovina brasileira pelo mercado norte-americano está associado com o avanço recente do desmatamento na Amazônia. Só no ano passado, os EUA compraram mais de 145 mil toneladas do produto brasileiro, tornando-se assim o 2º maior comprador de carne bovina do país. Analistas esperam que a demanda dobre neste ano, mesmo com o preço em alta do produto no mercado internacional. A maior fornecedora dessa carne é a gigante JBS, que vem tropeçando com suas políticas e metas de combate ao desmatamento e monitoramento da cadeia produtiva.
Fonte: Com Coalizão Brasil
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