A empresa que mais foi multada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) por destruir a floresta em Unidades de Conservação federais está no Pará. Trata-se da Salobo Metais S/A, localizada em Marabá e ligada à mineradora Vale, segundo levantamento do site de jornalismo investigativo chamado Agência Pública publicado na segunda-feira, 14/03.
A subsidiária já recebeu um total de R$ 52,6 milhões em multas e é a quinta com maior valor em infrações quando se consideram pessoas físicas e jurídicas.
Segundo o estudo, Salobo, Energia Sustentável do Brasil (ESBR) S/A, concessionária da Usina Hidrelétrica de Jirau, e a Floraplac, que produz chapas de MDF, ligada ao Grupo Concrem, receberam um total de R$ 130,8 milhões em multas aplicada pelo ICMBio na região das Unidades de Conversação e Biodiversidade (UCs), no período de 2009 a 2021. Dessas três, Salobo e Floraplac estão no Pará.
A Salobo já foi multada em três ocasiões por infrações no interior da Floresta Nacional (Flona) de Carajás, na região de Marabá. Da base analisada, a unidade de conservação é a 13ª com maior valor em multas, com R$ 52,8 milhões, sendo a Salobo responsável por 95% delas.
Em outubro do ano passado, a Salobo recebeu multa milionária de cerca de R$ 35 milhões por “causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana e na mortandade de animais” na Flona de Carajás, informa a agência.
Em setembro de 2014, foi multada em R$ 50 mil por causar danos à Flona de Carajás e também à Área de Proteção Ambiental (APA) do Igarapé Gelado, na mesma região. A infração está relacionada ao “derramamento de 12.900 litros de óleo diesel em igarapé após acidente com caminhão tanque”. Anos antes, em 2012, a empresa foi multada em R$ 15 milhões por destruir ou danificar mil hectares no interior da UC.
Além das três multas na UC em questão, a Salobo já recebeu multa de R$ 10 mil por conta do derramamento de óleo diesel na Flona do Tapirape-Aquiri, também em Marabá.
Uma das barragens da empresa está localizada no interior da Tapirape-Aquiri e tem capacidade para armazenar mais de 70 milhões de metros cúbicos de rejeitos, mais de dez vezes o volume da barragem de Brumadinho (MG).
Segundo lugar
A segunda empresa da lista com mais multas é a concessionária da Usina Hidrelétrica de Jirau, a Energia Sustentável do Brasil (ESBR) S/A, com uma multa no valor de R$ 48,5 milhões, recebida em março de 2017 por “danificar 4.047 hectares de floresta nativa”, no Parque Nacional (Parna) Mapinguari, localizado entre o Amazonas e Rondônia.
A empresa tem quatro acionistas: a Engie Brasil Energia, controlada pelo grupo franco-belga Engie, segundo maior do mundo em geração de energia e com participação do governo francês; a Mizha Participações, que é uma das subsidiárias da Mitsui & CO, gigante multinacional de origem japonesa; a Eletrobras CGT Eletrosul e a Eletrobras Chesf, ambas ligadas à estatal brasileira Eletrobrás, lembra a Agência Pública.
Floraplac em terceiro
Fechando a lista das três maiores empresas infratoras está a Floraplac, que produz chapas de MDF e é a segunda maior empregadora privada de Paragominas (PA). Ela é ligada ao Grupo Concrem, gigante do setor madeireiro na Amazônia. A empresa já recebeu cinco autuações por infrações ambientais no interior da Reserva Biológica (Rebio) do Gurupi, no oeste do Maranhão, próxima à divisa com o Pará. As duas multas, com valor definido, foram aplicadas em setembro de 2011 e envolvem a danificação de 2.580 hectares de floresta e a extração seletiva de 100 hectares de madeira no interior da Rebio. Somadas, as multas ultrapassam R$ 32,1 milhões.
A Concrem é de propriedade de Vitório Sufredini Neto e da família D’Agnoluzzo, e acumula processos ambientais desde os anos 2000.
Existe ainda um processo judicial em tramitação, que tem como réus parte das empresas do grupo, os sócios Emerson e Anderson Gineli, que também foram multados em mais de R$ 32 milhões no interior da mesma UC.
Segundo a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), eles integrariam “um amplo esquema criminoso voltado à sistemática extração clandestina de produtos florestais no interior da Reserva Biológica do Gurupi e da Terra Indígena Caru”.
Em 2021, a empresa ganhou destaque depois de reportagem do Fantástico (13/06/21) ter revelado que a maior multa recebida pela Floraplac, na casa de R$ 30,9 milhões, teve o processo reaberto.
Em resposta aos questionamentos da Agência Pública, a empresa afirmou utilizar madeira 100% reflorestada, negou que tenha cometido a infração ambiental e também negou a interferência da diretoria do órgão na revisão do processo.
Levantamento
Além das empresas, a análise realizada pela Agência Pública com base em dados obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI) pela Fiquem Sabendo, agência de dados especializada no acesso a informações públicas, revela que são cerca de 10,5 mil autuações lavradas pelo ICMBio na região ao longo do período analisado.
Este órgão é responsável pela gestão e fiscalização das 334 UCs federais espalhadas pelo Brasil — protegendo cerca de 10% do território nacional.
Segundo informações presentes no material levantado, foram selecionadas as 132 UCs federais do bioma amazônico, tanto de proteção integral quanto de uso sustentável, administradas pelo ICMBio.
Essas 132 UCs concentram 9.400 multas com valor especificado, resultando em mais de R$ 3 bilhões. Ainda existem informações para saber quantas foram pagas, mas de acordo com algumas fontes, estas dívidas são raramente quitadas.
Com estas informações, foi possível verificar quais são as UCs mais visadas e quem são as pessoas físicas (veja infográfico abaixo) responsáveis pela destruição da maior floresta tropical do mundo.
As empresas citadas na matéria foram procuradas pela Agência Pública, assim como o presidente do ICMBio, Marcos Simanovic. Vale/Salobo, Jirau Energia e o mandatário do órgão ambiental não deram retorno até a publicação.
Pagamento
A Agência Pública informa ainda que em abril de 2019, o governo Bolsonaro instituiu uma nova etapa no processo de julgamento de multas aplicadas pelo ICMBio. Até então, a autuação era feita, o infrator, notificado e a infração, julgada em duas instâncias no órgão ambiental. A partir do Decreto nº 9.760, assinado por Jair Bolsonaro e pelo então ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, a “conciliação ambiental” foi introduzida.
A modificação pelo atual governo fez com que o processo de fiscalização do órgão, que já é historicamente lento e raramente resulta no pagamento das multas, se tornasse ainda mais intrincado.
“O governo não tem interesse nenhum em impressionar, em fazer com que os mecanismos administrativos cheguem até o final pela cobrança dessa multa. São bilhões. Imagine se esses recursos fossem destinados para as próprias unidades de conservação, para infraestrutura, para equipes, para fiscalização… Essas unidades teriam um outro status de implementação, garantindo proteção, tendo equipes de campo”, aponta Antonio Oviedo, assessor do Programa de Monitoramento de Áreas Protegidas do Instituto Socioambiental (ISA).
Fonte: Agência Pública
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