O Pará é o Estado brasileiro com maior número de requisições para exploração mineral em terras indígenas. Os territórios mais afetados por esses pedidos são a TI Xikrin do Cateté (PA) com 34 requerimentos, seguida pela TI Sawré Muybu (PA), com 21. A etnia mais impactada por estes pedidos de mineração é a Kayapó (PA), com 73 requerimentos. A TI Waimiri Atroari (AM) também tem 34 pedidos.
É o que revela o novo relatório Cumplicidade na Destruição IV – Como mineradoras e investidores internacionais contribuem para a violação dos direitos indígenas e ameaçam o futuro da Amazônia, lançado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a organização Amazon Watch, que divulgaram o documento na terça-feira, 22/02.
As duas organizações mapeiam os interesses das grandes mineradoras em terras indígenas desde 2020 e garantem que, mesmo após os declarações públicas de gigantes como a Vale e a Anglo American de que abriram mão dos seus pedidos para pesquisa e exploração mineral nesses territórios, muitos dos seus requerimentos seguem ativos no sistema da ANM – em alguns casos, até aumentaram.
Além disso, alguns requerimentos foram redesenhados para que as áreas de exploração fiquem contíguas às terras indígenas, ainda causando enormes impactos.
O documento foca nos interesses minerários em terras indígenas de nove mineradoras: Vale, Anglo American, Belo Sun, Potássio do Brasil, Mineração Taboca e Mamoré Mineração e Metalurgia (ambas do Grupo Minsur), Glencore, AngloGold Ashanti e Rio Tinto.Juntas, elas possuíam em novembro de 2021 um total 225 requerimentos minerários ativos com sobreposição em 34 Terras Indígenas – uma área que corresponde a 5,7 mil quilômetros quadrados – ou mais de três vezes a cidade de Brasília ou de Londres.
“É preciso um entendimento geral de que essas áreas não estão disponíveis para exploração mineral, e nem devem estar, tanto pelo respeito ao direito constitucional de autodeterminação dos povos indígenas sobre os seus territórios quanto pela sua importância para combater as mudanças climáticas e garantir a vida no planeta. O mesmo vale para territórios tradicionais e outras áreas de preservação. Esse entendimento deve vir do Estado, mas também das empresas (que têm totais condições de saber quais áreas estão pleiteando para sequer protocolar esses requerimentos), e das corporações financeiras que as financiam”, complementa Dinaman Tuxá, da coordenação executiva da Apib.
Quem banca
Enquanto isso, as principais instituições financeiras globais estão capacitando o destrutivo setor de mineração da Amazônia com bilhões de dólares em investimentos, empréstimos e subscrição. Nos últimos cinco anos, essas empresas destacadas no relatório receberam um total de US$ 54,1 bilhões em financiamento do Brasil e do exterior.
Corporações sediadas nos Estados Unidos continuam entre as principais financiadoras cúmplices na destruição, como mostrado nos relatórios anteriores da série. Juntas, as gestoras Capital Group, a BlackRock e a Vanguard investiram US$ 14,8 bilhões nas mineradoras com interesses em terras indígenas e histórico de violações de direitos.
Destaca-se também a participação de instituições brasileiras no financiamento da grande mineração: o fundo de pensão brasileiro Previ (Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil) é o responsável pelos mais altos investimentos nestas mineradoras, com mais de US$ 7,4 bilhões, seguido pelo banco Bradesco, com quase US$ 4,4 bilhões e a Caixa Econômica Federal, com US$ 786 milhões.
A empresa que mais recebeu investimentos e empréstimos nesse período foi a Vale, com US$ 35,8 bilhões, mostrando que nem mesmo os sucessivos desastres em Mariana e Brumadinho, ambos em Minas Gerais, diminuíram o apetite dos investidores com relação à mineradora.
Os dados, obtidos com com apoio da instituição holandesa Profundo Research and Advice, mostram também o grande interesse do Canadá em financiar a mineração no Brasil. O Royal Bank of Canada, maior banco privado do país, injetou US$ 512 milhões nas mineradoras, e é o principal investidor institucional do Projeto Volta Grande, de mineração de ouro, da empresa Belo Sun, considerado socialmente e ecologicamente inviável.
Outro lado
A AngloGold Ashanti informou, por meio de nota, que “não opera e não tem interesse em operar em Terras Indígenas (TIs)”. Afirma que na década de 1990, “a produtora de ouro solicitou requerimentos de pesquisa mineral em diversas regiões no país. Três dessas áreas posteriormente foram demarcadas como Terras Indígenas (TIs), o que levou a companhia a desistir das mesmas. A decisão foi protocolada junto à Agência Nacional de Mineração (ANM) no final da década de 1990. No entanto, como não houve atualização do processo no sistema da ANM, a AngloGold Ashanti ratificou a retirada do requerimento de pesquisa em 21 de junho de 2021. Atualmente, os investimentos da empresa no Brasil estão concentrados basicamente na expansão de suas minas localizadas em Minas Gerais e Goiás”.
Conforme você leu acima, no entanto, o pedido da mineradora ainda figura como ativo no sistema da ANM.
Fonte: Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e Amazon Watch
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