A piscicultura de peixes nativos, que pode ser uma das bases para o desenvolvimento da bioeconomia na Amazônia, está prestes a estagnar. O setorprecisa de uma política estratégica que apoie a assistência técnica, a produção, a comercialização e a divulgação dos produtos locais. Essas são as conclusões apresentadas no mais recente estudo do Instituto Escolhas que aborda o “potencial esquecido” da atividade na região.
A pesquisa apresenta um levantamento inédito sobre a piscicultura, que ocupa uma área de 76.942 hectares de lâmina d’água com 61.334 empreendimentos, em sua maioria (95,8%) pequenos produtores com até 5 hectares. Já a produção atingiu o pico em 2015 com 220 mil toneladas de peixes e, desde então, tem oscilado entre 160 mil e 175 mil toneladas, enquanto que nacionalmente o setor cresce de 3% a 5% ao ano.
No Pará, a situação também é preocupante. O estado foi pioneiro do desenvolvimento do setor na região nos anos 1970, porém foi perdendo espaço a partir dos anos 2000, quando as normas passaram a proibir o cultivo de espécies exóticas, o que favoreceu as estratégias para as espécies nativas, mas acabou restringindo o alcance de mercado que é voltado para atender as demandas locais.
De acordo com o Instituto Escolhas, o tambaqui e os híbridos tambacu e tambatinga são as espécies dominantes na piscicultura paraense, com participação de 81,9% na produção. São aproximadamente 14 mil toneladas produzidas por ano, bem abaixo do líder regional que é o estado de Rondônia com 57,2 mil toneladas anuais.
Investimento em assistência técnica
Alguns dos entraves detectados foram a saturação do mercado regional e a inativação de cerca de 19% das áreas de piscicultura. De acordo com a análise, caso essas áreas fossem reativadas, seria possível aumentar a produção local sem expandir a lâmina d’água, mas para isso são necessários investimentos em assistência técnica e ração e alevinos de melhor procedência.
“Um avanço consistente no mercado nacional depende da resolução de dois gargalos: solucionar os problemas responsáveis pela baixa produtividade, como a falta de acesso à assistência técnica adequada, e aumentar a produção”, ressalta Sérgio Leitão, diretor executivo do Instituto Escolhas.
Outro problema identificado é a falta de acesso ao crédito decorrente da dificuldade dos piscicultores de regularizar os empreendimentos e pleitear os recursos. Do total de R$ 665,6 milhões disponibilizados para operações de custeio no setor, R$ 189 foram contratados nos estados da Amazônia Legal. Já no quesito investimento, os empreendedores fizeram aportes de R$ 5,3 milhões, equivalente a uma participação de apenas 10,5% em relação ao total nacional.
Além disso, o estudo aponta que há um desinteresse dos governos estaduais e federal em reconhecer o potencial da piscicultura. Isso se reflete, por exemplo, na falta de dados atualizados sobre a atividade e no marco regulatório defasado. Nesse cenário, a previsão é que em uma década o setor terá um crescimento de apenas 4,6%, passando de 175 mil toneladas produzidas para 183 mil toneladas, o que representa a estagnação da atividade.
“Temos milhares de pequenos piscicultores na Amazônia que se mantêm atuantes apesar da falta de acesso à assistência técnica e infraestrutura e da ausência de visão dos governos locais sobre o potencial dessa cadeia produtiva e sua importância no contexto regional”, comenta Sérgio Leitão, reforçando que a atividade é viável economicamente, contribui para a segurança alimentar e a geração de renda na região.