Já que há diversos entendimentos sobre o significado dessa tal bioeconomia, que é o tema central do Fórum Mundial de Bioeconomia, que é realizado até quarta-feira, 20/10, em Belém, a secretária executiva de Ciência, Tecnologia e Inovação do Amazonas, Tatiana Schor, expôs com a clareza das águas dos rios do nosso bioma seu entendimento sobre o assunto durante o evento, nesta terça-feira, 19/10.
Já que esse assunto veio para ficar, ou seja, o termo precisa ser repetido igual mantra em nossas cabeças, com a certeza de que ganhará atualizações, melhor irmos nos familiarizando com as diversas abordagens.
Para Tatiana, que é professora da Universidade Federal do Amazonas, é preciso partir de quatro princípios para que fique claro o que é bioeconomia.
- Bioeconomia é conservação da diversidade. Ou seja, se aquele açaí nosso de todo dia vem só de área de monocultura, tem agrotóxico e expõe seus produtores a condições degradantes de trabalho, então esse açaí não pode ser considerado um produto da bioeconomia.
- Bioeconomia é a diminuição das desigualdades socioterritoriais. Ou seja, se o local de onde extraímos essas riquezas naturais apresentam os piores índices de desenvolvimento humano, se seus habitantes não estão na escola, se não têm acesso a saneamento, se suas doenças não são tratadas pelo poder público, se o extrativista é explorado sem ver a cor do dinheiro, aí fica difícil dizer que funciona uma bioeconomia nesse local.
- Bioeconomia é ciência, inovação e tecnologia. Ou seja, não estamos falando apenas de máquinas e processos modernos de produção, mas também de saberes milenares do povo da nossa região. Por exemplo, quando perdemos uma língua indígena, perdemos também, além do idioma que transmite conhecimento ao longo dos séculos, conhecimento de fitoterápicos. O saber que vem também dos laboratórios das universidades públicas deste país têm papel fundamental nesse processo.
- Bioeconomia é a preservação dos nossos biomas. Ou seja, segundo a professora, os produtores da bioeconomia precisam ser tão agressivos quanto os donos do agronegócio brasileiro quando ampliam áreas de produção. Não adiantaria pensar apenas na floresta em pé, mas também expandir territorialmente os biomas e recuperar as áreas degradadas.
Tatiana assumiu a pasta do governo amazonense em 2019 e, desde então, trabalha no melhoramento de um programa estruturante de bioeconomia no Amazonas com a participação de Deus e o mundo ligado à terra. “Eu não imaginei construir o programa sem fazer escuta aos mais diversos setores da sociedade”, contou ela durante o Fórum.
Seu grupo de trabalho pesquisa o que foi definido como escalas. São três:
- A bioeconomia da sociobiodiversidade, que diz respeito à relação da sociedade, incluindo representantes de todas as comunidades e conjuntos sociais que compõem a Amazônia, com a natureza. Isso implica num conjunto de salvaguardas, de politicas e ações especificas para esse mundo da bioeconomia.
- A bioeconomia de base florestal, que é aquela à qual estamos acostumados a lidar desde que o mundo é mundo, desde os tempos coloniais, passando pelo ciclo da borracha, com enorme assimetria de informação ao longo da cadeia. “A gente não tem dado fidedigno para falar de bioeconomia da Amazônia. Fala-se, por exemplo, de castanha, mas não temos um laboratório para certificar o produto”, lembra a professora.
- A bioeconomia das commodities, que é aquela que produz soja, milho e gado. Essa aí é aquela que precisa estar mais sensível a questões climáticas, por exemplo, para que toda a produção não vá para o brejo. “Tem que começar a ver como trazer esses atores para produção mais sustentável”, cobra ela, citando que, quando as discordâncias falam mais alto, o resultado é sempre violência no campo. E o paraense sabe direitinho o que ocorre para as bandas do sudeste paraense por causa do desmatamento…
A fala da professora, enfatizando a necessidade de participação das comunidades tradicionais no debate da bioeconomia, já que são elas mantêm a floresta em pé, foi feita justo após uma saia-justa no evento. A ativista indígena Puyr Tembé (na foto), pertence à aldeia dos Tembé do Alto Rio Guamá, se indignou com a escassez de indígenas na programação do Fórum. Ela cobrou em alto e bom tom que era um “absurdo” o evento internacional falar de bioeconomia sem a presença dos povos. Leia mais aqui sobre esse pitiú.
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