Com a energia cada vez mais cara, pagar a conta de luz virou artigo de luxo. Segundo uma pesquisa do Instituto de Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec) e do Instituto Clima e Sociedade, 22% dos brasileiros deixaram de comprar alimentos básicos para pagar as contas de luz e gás. No Pará, o 2º maior gerador de energia elétrica no Brasil, com capacidade de produção atual de mais de 22 MW, segundo dados do Anuário Estatístico de Energia Elétrica, a tarifa é a mais cara do país. De acordo com o ranking da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), os paraenses pagam cerca de 59% a mais que os consumidores de outras regiões.
Nesse contexto, hidrelétricas construídas na Amazônia, como a de Belo Monte, geram impactos socioambientais como a emissão de gases de efeito estufa na área alagada, destruição da fauna e flora e desalojamento de comunidades que perdem seus territórios e ainda têm que arcar com preços exorbitantes na conta de luz.
“Hidrelétricas, termelétricas e demais megaprojetos quase sempre têm impactos muito grandes. Por isso, defendemos que as comunidades tenham as ferramentas para decidir que tipo de energia querem e de onde essa energia deve vir, para que a geração energética impacte o mínimo possível o modo de vida das pessoas e o meio ambiente”, explicou Ilan Zugman, diretor para a América Latina da 350.org, organização que atua pela transição energética e justiça climática, em entrevista a DW Brasil.
Custos com energia pressionam o orçamento da população
As altas sucessivas nas contas de energia pesam sobre o bolso de muitos consumidores e ainda travam a possibilidade de que novos empreendimentos surjam na região.
“O Pará tem o corte de renda muito baixo e a gente não tem todo o desenvolvimento, inclusive na geração de empregos, que sul, sudeste e até o centro-oeste têm. Então, quando nós estamos falando de desenvolvimento, a energia elétrica é um insumo fundamental. E além de pesar no orçamento das famílias paraenses, esses altos custos travam a possibilidade de que novos empreendimentos surjam na região norte. Energia nós temos, fornecemos bastante, mas ela é muito cara”, afirmou Everson Costa, técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) no Pará.
A dona de casa Maria Helena Gomes, 66 anos, que o diga. Moradora de Altamira, ela paga caro na conta de luz mesmo vivendo em uma casa pequena e com poucos eletrodomésticos.
“Eu nem tenho muito eletrônico em casa e mesmo economizando a energia vem R$ 350. É um absurdo a gente ter que pagar uma energia que é considerada uma das mais caras do país”, afirmou Maria.
O técnico do Dieese explica que só o gasto com alimentação já compromete 57% da renda de grande parte dos paraenses, sobrando pouco para as outras necessidades.
“No Pará, além do corte de renda ser baixo mais da metade da população ocupada ganha até um salário mínimo e só o gasto com alimentação compromete cerca de 57% deste salário mínimo só pra adquirir os produtos da cesta básica. Sobra muito pouco para fazer frente a medicamentos, aluguel e também a energia elétrica assim como outras obrigações. Então, o custo da energia elétrica acaba fazendo com que o custo de vida dos paraenses fique ainda mais pesado por esses fatores.”
Afinal, de onde vem nossa energia?
Segundo Everson, a energia que alimenta o estado do Pará vem em grande parte da própria produção interna, mas em razão do sistema de produção ser interligado, isso não a torna mais barata.
“A gente está falando aqui de hidrelétricas como a de Altamira e Tucuruí que fornecem energia não só pro Pará, mas para o país inteiro. É importante enfatizar que o Sistema Nacional de Produção de Energia Elétrica é interligado e pela legislação atual, independentemente de você produzir mais ou menos, as tarifas são as mesmas. Isso fez com que ao longo dos anos – e principalmente depois da privatização da antiga Celpa e agora Equatorial, que aconteceu lá em fevereiro de 1998 – essa tarifa tivesse em média cerca de 800% de reajuste”, esclareceu ele.
Priscila Campos, 41 anos, é manicure e afirma que sua conta já chegou a R$ 800.
“Eu moro com meu marido e filho no bairro do Mutirão, aqui em Altamira, e a conta já veio mais do que eu ganho em alguns meses. Com certeza deveria ser menor porque aqui nós temos as hidrelétricas” disse Priscila.
Ao longo dos anos, surgiram demandas parlamentares e sugestões de que os estados que têm uma produção elevada nesse setor, possam usufruir nas suas contas de valores mais equilibrados. Afinal, nesse processo, os paraenses sofrem impactos da instalação dessas hidrelétricas, como a desocupação e questões ambientais. O pesquisador defende que o Pará deveria estar numa posição mais privilegiada em relação ao pagamento e subsídio dessa energia.
“A energia é fundamental para que a indústria se movimenta a partir dela. Energia elétrica é algo que a gente precisa perseguir no sentido de ser barateado, de ser facilitador do desenvolvimento e indutor de geração de emprego e renda”, finalizou o técnico.