A queima de combustíveis fósseis no Brasil – que está entre os dez maiores produtores de fonte de energia não renovável no mundo – já representa 19% das emissões do Brasil, de acordo com relatório do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) divulgado nesta segunda-feira, 8/11.
Como você já leu por aqui, na semana passada, na Conferência do Clima da ONU (COP26), uma coalizão de 20 países, entre eles os EUA, se comprometeu a parar de financiar, justamente, projetos de energia fóssil “sem compensação” no exterior a partir de 2022.
Em entrevista coletiva da rede de ONGs Climate Action Network, a pesquisadora Jean Su deu a dimensão da disparidade em investimentos: o pacto dos 20 países, segundo ela, tem o poder de tirar US$ 18 bilhões dos fósseis e colocá-los nas energias renováveis. Somente o G20 investiu US$ 188 bilhões em fósseis entre 2018 e 2020.
O documento divulgado hoje pelo Inesc é mais uma razão para que se coloque em xeque o fluxo de dinheiro que ainda predomina no mundo em direção a esse tipo de matriz energética, uma das mais poluidoras do planeta.
Comparativo
Segundo a pesquisa, em 2020, foram concedidos R$ 123,9 bilhões de incentivos e subsídios aos combustíveis fósseis, o que equivale a 2% do PIB do ano e 72% de todo o gasto federal com saúde no ano de 2020, que foi de R$ 171,82 bilhões. Sem falar que é 10% superior aos R$ 113,23 bilhões gastos pelo governo com educação no mesmo ano.
Segundo o Observatório do Clima e o Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG), em 2019, o Brasil emitiu 2,1 toneladas brutas de gases de efeito estufa, um aumento de quase 10% em relação ao ano anterior. Em perspectiva setorial, 44% das emissões de 2019 foram provenientes de mudanças do uso da terra (desmatamento), 28% da agropecuária e 19% da energia, incluindo atividades que utilizam combustíveis fósseis, além de 4% advindos de resíduos e 5% de processos industriais.
O estudo do Inesc classificou o montante que deixa de entrar para os cofres públicos por modalidade, isto é, subsídios e incentivos para os consumidores e para as empresas que produzem esses combustíveis.
À produção, foram concedidos R$ 60,62 bilhões em subsídios, principalmente por meio dos diversos regimes especiais de tributação ao setor de óleo e gás, sendo o maior deles o Repetro. Isso corresponde a 49% do total.
Ao consumo, foram concedidos, em 2020, R$ 63,32 bilhões (ou 51% do total) em subsídios, boa parte deles envolvendo o PIS/Cofins e a Cide-Combustíveis aplicados à gasolina e ao óleo diesel. Também estão incluídos os orçamentos da Conta de Consumo de Combustíveis (CCC) e Conta de Desenvolvimento Energético (CDE-Carvão).
A assessora política do Inesc e responsável técnica pelo estudo, Alessandra Cardoso, aponta que o tema deve ganhar especial atenção no atual contexto de intensa crise econômica, além de pautar o debate sobre a poluição causada pela emissão de combustíveis fósseis na atmosfera na conferência mundial COP26.
“Os incentivos e subsídios concedidos aos combustíveis fósseis estão intrinsecamente ligados às resistências globais dos países, da indústria e dos investidores em restringirem o crescimento da produção e das emissões, o que atrasa a inadiável transição energética”, analisou.
Petróleo e gás
A edição da pesquisa destaca o crescimento expressivo das renúncias associadas à produção de petróleo e gás, cujo valor alcançou R$ 58 bilhões. Só o programa de renúncia conhecido como Repetro, em 2020, implicou uma perda na ordem de R$ 50 bilhões, ante os R$ 28 bilhões alcançados em 2019, o que representa um crescimento de 78% em apenas um ano.
Segundo o estudo, esse subsídio é, de longe, o maior subsídio à produção de combustíveis fósseis no Brasil. Cabe lembrar que o regime especial de tributação, cujo fim estava previsto para o ano que vem, foi renovado e ampliado pela Lei Nº 13.586/2017, e deverá vigorar até 2040.
A falta de transparência sobre como são concedidos os subsídios também são destaques do relatório. As “outras renúncias” responderam por R$ 110,57 bilhões, o que corresponde a 89% do total. Essas renúncias hoje não são assumidas pela Receita Federal do Brasil (RFB) como gastos tributários.
“A falta de transparência é sintomática dos pesados interesses econômicos por trás dos subsídios e contribui, entre outras coisas, para que o tema seja ainda pouco conhecido. O estudo do Inesc pretende contribuir para a debate público”, afirma Alessandra.
O Inesc sugere medidas para que o País caminhe na direção de “conhecer, avaliar e reformar” os subsídios aos combustíveis fósseis. Entre elas, que o Congresso aprove o Projeto de Lei Complementar 162/2019, que estabelece a obrigação de divulgação de quais empresas recebem incentivos fiscais no Brasil e seus devidos valores, e que provoque o Tribunal de Contas da União a dar continuidade ao trabalho de avaliação do Repetro para ampliar a transparência e a avaliação da eficiência e da efetividade desses benefícios à luz dos desafios de reforma assumidos pelo Brasil junto ao G20.
Fonte: Própria com Inesc
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