Ao paraense basta abrir uma janela ou porta de casa para perceber como a floresta amazônica é um laboratório a céu aberto. Tirar proveito dos produtos naturais que a terra oferece não é tarefa fácil para muitos ribeirinhos e empreendedores. Vários, diante da falta de capacitação técnica, recursos financeiros e dificuldades logísticas, acabam por escolher o caminho da pecuária ou das monoculturas. Só que cada vez mais as pesquisas indicam que as riquezas naturais da floresta paraense têm permitido a sobrevivência não só das famílias envolvidas, mas também da floresta.
Um bom exemplo vem de Alter do Chão com a marca Ekilibre, que fabrica artesanalmente cosméticos e produtos de higiene pessoal a partir de ervas, raízes, frutas e frutos conhecidos há gerações dos povos da floresta. A estimativa é de que o empreendimento beneficia 40 famílias entre ribeirinhos, indígenas e assentados. Sua cadeia produtiva inclui coletivos do Pará, Roraima, Rondônia, Amazonas e Acre.
São entre 20 e 30 tipos de produtos originais da Amazônia, zero sintéticos, sem conservantes e considerados veganos. O carro-chefe da cartela de produtos são os protetores solares, cremes antimanchas, produtos para acne e antienvelhecimento.
A farmacêutica bioquímica da Ekilibre, Zezé Freitas, contou ao Pará Terra Boa que hoje um dos principais gargalos para levar o empreendimento adiante, abalado, como vários setores da economia no mundo pela pandemia do novo coronavírus, é a logística. “Estamos em Alter, a 30 km de Santarém. É um parto escoar os produtos para cidades maiores. Tem uma ida semanal para levar e trazer, a logística é um gargalo”, conta a sócia da marca, acrescentando à lista de obstáculos a falta de certificação de identificação orgânica.
Ainda assim, a Ekilibre colhe seus frutos há cerca de dez anos, colecionando prêmios pela forma sustentável com que fabrica seus produtos, bem como atendendo ao mercado nacional por meio do e-commerce. A marca também acaba de passar para a etapa final do projeto Inova Amazônia, desenvolvido pelo Sebrae.
Outra novidade nesse caminho pós-pandêmico é o fortalecimento da linha profissional para salões de beleza livres de produtos químicos. A Ekilibre já trabalha com o Manuela Hair Club, de Belém, nesse sentido. Isso porque cresce cada vez o número de clientes que querem se livrar de químicos ou que procuram produtos naturais contra alergias ou que estejam em tratamento oncológico.
“São os chamados salões verdes, mas ainda é um oceano azul. Tem muita gente preocupada com o próprio corpo e também com o meio ambiente”, conta.
Outra proposta verde da marca é levantar projetos, em parceria com o setor privado, para construção de fossas ecológicas, no qual é feita a separação e transformação de matéria orgânica contida no esgoto, com tratamento de água para devolvê-la ao meio ambiente. “Nós temos a nossa fossa na fábrica. Reaproveitamos tudo”, conta Zezé.
A farmacêutica reconhece que os produtos amazônicos têm recebido atenção do público, no Brasil e no mundo, mas que o caminho ainda é árduo e longo para que a cadeia produtiva fique de pé.
“O que está acontecendo agora é que as pessoas estão olhando para o mesmo lugar, mas a verdade é que o setor precisa de muito, mas muito investimento ainda para decolar. Nossos gastos são altos, não há selo orgânico, corremos atrás de editais, há vários problemas de logística, mas estimulamos bastante as famílias para que mantenham suas florestas de pé”, conclui Zezé.