Por Fabrício Queiroz
Temperaturas elevadas, pouca ou nenhuma chuva registrada em um longo período, agricultura prejudicada, comunidades isoladas e falta de assistência são apenas alguns aspectos do cotidiano enfrentado por milhões de pessoas na Amazônia pelo segundo ano consecutivo. O cenário é crítico em importantes bacias hidrográficas da região, como as dos rios Tapajós e pelo Xingu, e o mais preocupante é que tudo indica que o pior ainda não passou.
De acordo com o Centro Nacional de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden), aumentou de 26 para 56 o número de municípios paraenses em situação de seca severa de agosto para setembro. Em todo o Norte são 177 municípios atingidos, sendo que 27 estão classificados em uma categoria mais grave de seca extrema. Em algumas regiões, já são cerca de 120 dias sem chuva, como é o caso dos municípios de Santana do Araguaia e Cumaru do Norte, no extremo sul do Pará.
São esses elementos de uma realidade impensável para uma região de floresta úmida e com uma das maiores reservas hídricas do planeta que tornam a mobilização de ajuda pela Amazônia e suas populações ainda mais desafiadora, avalia Caetano Scannavino, empreendedor social e coordenador do projeto Saúde & Alegria (PSA), que há 36 anos atua no território do Baixo Tapajós, no oeste paraense.
“É difícil convencer a sociedade brasileira que a Amazônia sofre de estresse hídrico, mas se o País se uniu pelo Sul, ele pode se unir pela Amazônia. É lamentável que não exista a mesma mobilização quando se fala da Amazônia ou do Norte. Existe quando se fala do desmatamento ou das queimadas, mas a situação da estiagem e estresse hídrico não é facilmente absorvida porque as pessoas não conhecem a região nos seus detalhes”, analisa.
Realidade desconhecida
A indignação de Caetano Scannavino tem uma razão profunda, afinal quanto mais desconhecida é uma realidade menos se consegue apoio, recursos e ações práticas para enfrentamento e resolução de problemas. Se por um lado o regime de secas e cheias faz parte do ciclo natural, Scannavino alerta que essas alterações estão ficando cada vez mais drásticas e ocorrem em um intervalo de tempo menor, o que potencializa os impactos desta seca e outros eventos que devem vir.
“Não dá para normalizar essa situação com comunidades em situação de isolamento, com dificuldades de deslocamento, sem acesso a transporte, aos serviços de saúde, com fome e sem água potável. Por mais que se ponha a culpa nas mudanças climáticas, uma crise humanitária desse tamanho deve ser responsabilidade também dos tomadores de decisão locais. Essas populações não estariam sofrendo tanto se houvesse investimento em sistemas de abastecimento e tratamento de água, combate ao desmatamento e incentivo para restauração florestal, principalmente em áreas de nascentes”, afirma Caetano.
Distribuição de filtros
Na tentativa de lidar tanto com o desconhecimento da sociedade e o desinteresse dos governantes locais, o PSA e parceiros de organizações da sociedade civil, movimentos sociais, conselho indígena e representações territoriais se uniram para alavancar uma solução emergencial já realizada na seca do ano passado de distribuição de kits com nanotecnologia capaz de filtrar as impurezas da água e torná-la própria para o consumo humano. A ação conta com uma campanha de financiamento na internet e corre contra o tempo para alcançar 5 mil famílias do Baixo Tapajós até o final do ano.
“É um esforço logístico para fazer o maior número de entregas antes do ápice da estiagem que geralmente ocorre entre o final de novembro e início de dezembro. A mobilização é tanto para ajudar a atenuar o sofrimento dessas populações, mas também para apresentar soluções como essa que são simples e duradouras e que podem ser multiplicadas com o apoio de governos e mais recursos”, argumenta Caetano Scannavino.
Você pode ajudar a levar água potável para as populações amazônidas afetadas pela seca contribuindo com a campanha “Filtros portáteis de micromembrana do Projeto Saúde & Alegria”. Para saber como doar, clique aqui.