Por Fabrício Queiroz
Um dos traços mais marcantes da cultura paraense é a culinária típica. Atualmente, pratos como a maniçoba, o vatapá e o tacacá estão se popularizando Brasil afora com a divulgação por chefs renomados e pelas mídias. O tacacá, por exemplo, foi a comida mais buscada no Google em 2023, graças ao sucesso da canção “Voando pro Pará” da Joelma, Nas ruas de Belém, porém, são as mulheres comuns as responsáveis não apenas pelo preparo da comida, mas também pela condução dos seus negócios. No Dia Internacional da Mulher, o Pará Terra Boa conversou com duas tacacazeiras, duas referências desse ramo na cidade.
O cheiro da maniva, do tucupi, do camarão e outras delicias está presente em muitas ruas de Belém. A origem costuma ser as barracas de comidas típicas encontradas em diferentes bairros, onde o conceito de fast-food chegou bem antes das grandes franquias de hamburgueres e lanches rápidos. Nesses pontos, a presença feminina tem um papel importante, desde a cozinha até à administração dos negócios.
“Esses negócios sempre foram tocados pelas mulheres. Hoje em dia, está mais misturado, mas é um espaço que nós conquistamos”, lembra a cozinheira Maria de Fátima Silva de Araújo, de 70 anos.
Mais conhecida como Fafá, ela é a responsável por um dos pontos de comidas típicas que mais atrai público no centro comercial de Belém. Entre os consumidores estão trabalhadores, além de turistas e do chef Thiago Castanho.
“Com 25 anos somente neste ponto, eu já me sinto um patrimônio. Apesar disso, a cada dia eu tenho um aprendizado”, diz Fafá.
Ela afirna possuir um sentimento de gratidão pelo trabalho com elemento cultural tão forte para os paraenses.
Na avaliação de Fafá, o segredo do sucesso é o bom atendimento que ela mesmo presta e estimula a ser reproduzido pelos filhos e netos que trabalham com ela. Porém, a cozinheira revela que o reconhecimento passa também pelo cuidado com o preparo da comida.
“Eu não trabalho com conservantes. Tem que manter o tempero natural. Se você colocar algo artificial, vai tirar o sabor da nossa culinária”, ressalta.
Pelas raízes da gastronomia paraense
Da mesma forma, a tacacazeira Maria Helena Trindade, de 57 anos, mais conhecida como Lica, é outra partidária da preservação das raízes da gastronomia paraense. Para ela, só é possível manter e conquistar clientes fiéis por causa da preferência pelas receitas na forma tradicional.
“Às vezes, estou no Ver-o-Peso e escuto os comentários de pessoas que querem modificar alguma coisa na receita. Eu sempre faço do meu jeito. O meu tucupi, por exemplo, é fervido só com alho, chicória e sal. Depois de quase 2 horas, quando tá quase pronto, que coloca alfavaca para dar aquele sabor. Tem gente que quer colocar açúcar, mas eu defendo o (tacacá) tradicional mesmo”, explica.
A banca montada em frente à igreja de São Judas Tadeu, no bairro da Condor, é outra referência na cidade, atraindo turistas e visitantes ilustres, como diplomatas estrangeiros e pesquisadores que escolhem o local para apreciar os pratos regionais.
Em 2024, a barraca completa 60 anos de história, somando o tempo de trabalho de Lica e da mãe dela, Russinda Trindade, que a antecedeu e inspirou.
“Eu sempre via ela fazendo. Eu tinha curiosidade e fui olhando e aprendendo. Eu faço o tacacá do mesmo jeito que ela fazia e, agora, estou passando para uma sobrinha. Vai passando de geração para geração”, conta ela.
Com 37 anos de jornada, Lica se diz feliz pelas conquistas que a profissão lhe proporcionou, mesmo que o trabalho ainda seja alvo de uma certa discriminação social.
“Ainda tem pessoas que, às vezes, querem menosprezar alguém porque trabalha com o tacacá. Eu mesma já escutei pessoas falarem (mal) das tacacazeiras. O preconceito sempre tem, mas eu não ligo. Tenho orgulho da minha profissão. Foi através dessa venda que eu conheci muita gente boa e que permitiu manter a minha família”, afirma.