Enquanto nossos senadores em Brasília aguardam sinal verde para votar o Pacote do Veneno (PL 6299/2002), as intoxicações por agrotóxicos atingem, em média, 50 bebês de 0 a 1 ano por ano Brasil. Entre os adultos, a média é de 15 contaminações.
Os dados revelados pela professora do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em agrotóxicos, Larissa Bombardi, foram consolidados a partir de registros do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde, e devem fazer parte da nova edição do atlas “Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia”.
“Agravos de notificação são doenças que precisam ser reportadas pelos Estados de forma obrigatória, como doenças infecciosas, Aids”, explica Larissa. “No Brasil, as notificações por intoxicação por agrotóxicos são obrigatórias desde 2011”.
Ela ressalta que os números só aumentaram desde então.
“Pela média, são 15 pessoas intoxicadas por ano. No antigo levantamento, eram 10. Entre os bebês de 0 a 1 ano, a média de intoxicações passou de 43 para 50 (ao ano). Essa alta tem se mantido para todos os recortes que tenho feito”, afirma Larissa.
A entrevista foi concedida ao site G1 e publicada na terça-feira 5/05. A reportagem questionou a CropLife Brasil. A entidade que representa as fabricantes de defensivos agrícolas afirmou que o critério para a liberação de agrotóxicos no Brasil é “baseado em ciência” e “orientado por metodologias consolidadas internacionalmente”.
Neste momento, o PL do Agrotóxico inicia a tramitação no Senado Federal. Cabe ao presidente Rodrigo Pachedo (PSD/MG) decidir se o projeto passará pelas comissões, ou se irá direto ao plenário.
Líder da bancada ruralista na legislatura passada, a ex-ministra da Agricultura Tereza Cristina (PP-MS) foi chamada à época de “Musa do Veneno” pelos ambientalistas. Foi ela que comandou a aprovação do “Pacote do Veneno” na Comissão Especial da Câmara dos Deputados.
Mortes por agrotóxicos
No Brasil, a contaminação por agrotóxicos provoca dois óbitos a cada dois dias e cerca de 20% das vítimas são crianças e adolescentes de até 19 anos, aponta um outro documento de Larissa, lançado na última semana, pela rede de ambientalistas Friends of the Earth Europe, organização que reúne ONGs e pesquisadores, e é assinado em parceria com a especialista holandesa em comércio Audrey Changoe. O documento também usa a base de dados do Sinan, do Ministério da Saúde.
Europa é maior fabricante
Atualmente, um dos pontos centrais do debate sobre o aumento das intoxicações, segundo a professora, é a aliança entre grandes empresas europeias que fabricam e exportam os agrotóxicos para o Brasil e o agronegócio nacional.
“Empresas europeias, como a Bayer/Monsanto e a Basf, que estão liderando os fabricantes europeus de agrotóxicos, têm promovido o acordo comercial UE-Mercosul através de grupos de lobby. Esse lobby tem buscado aumentar o acesso ao mercado para alguns de seus agrotóxicos mais danosos ao unir forças com associações brasileiras do agronegócio”, afirma o relatório da Friends of the Earth.
O documento da rede ambientalista aponta que, nos últimos três anos, Bayer e Basf tiveram 45 novos agrotóxicos aprovados no Brasil, sendo que 19 deles contêm substâncias proibidas na União Europeia.
‘Lobby do agronegócio’
Segundo o documento, uma estratégia de lobby usada pelas empresas de agrotóxico da União Europeia é “financiar vozes de terceiros para promover seus interesses comerciais”.
“Do lado brasileiro, o laboratório de ideias Instituto Pensar Agro promove mais uso de agrotóxicos e minimiza o papel do agronegócio no desmatamento. O Instituto Pensar Agro trabalha em parceria com tomadores de decisão do influente bloco do agronegócio no Congresso brasileiro”, destaca o relatório.
As pesquisadoras citam um levantamento feito pela rede “De Olho nos Ruralistas” que apontou que, entre 2019 e 2021, mais de 200 reuniões foram feitas entre o Instituto Pensar Agro e membros do governo Jair Bolsonaro.
Glifosato e mortalidade infantil
Em maio de 2021, um estudo realizado por pesquisadores das universidades de Princeton, FGV (Fundação Getulio Vargas) e Insper revelou que a disseminação do glifosato, substância considerada cancerígena, nas lavouras de soja levou a uma alta de 5% na mortalidade infantil em municípios do Sul e Centro-Oeste do Brasil que recebem água de regiões sojicultoras, o que representa um total de 503 mortes infantis a mais por ano associadas ao uso do glifosato na agricultura de soja.
À época, a Bayer, dona desde 2018 da Monsanto – empresa que lançou o glifosato no mercado em 1974, sob o nome comercial Roundup – avalia os resultados do estudo como “não confiáveis e mal conduzidos” e disse que a segurança de seus produtos é a maior prioridade da companhia.
Fonte: G1 e BBC
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