O aumento do desmatamento e da conversão de matas nativas, especialmente para a produção de soja e a pecuária, diminuíram o habitat da maioria das espécies da Amazônia e do Cerrado. Estes dados estão presentes numa análise realizada pelo WWF-Brasil e parceiros que avaliou 486 espécies (183 aves, 101 anfíbios, 118 mamíferos e 84 lagartos e serpentes). Algumas perderam mais da metade da área original de distribuição. As maiores perdas estão no Cerrado, conforme reportagem publicada pela WWF-Brasil, nesta segunda-feira, 21/02.
Entre as espécies ameaçadas, algumas são bem conhecidas pelos brasileiros, como o lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), que teve mais da metade de seu habitat perdido, e o tatu-bola (Tolypeutes tricinctus) escolhido pela Fifa como mascote oficial da Copa do Mundo de 2014. Em um período de cinco anos, o tatu-bola viu aumentar em 9% a cultura de soja dentro dos limites da sua distribuição, na região do Matopiba, no Cerrado.
A redução da diversidade de espécies está normalmente associada ao desaparecimento de ecossistemas e seus serviços ambientais. Como alerta o estudo, “o impacto sobre espécies associadas a áreas úmidas e matas de galeria como anfíbios, por exemplo, indica que estamos impactando também os recursos hídricos”
Do total de espécies analisadas, 136 são endêmicas, com mais de 95% da área de distribuição restrita a esses biomas. Nesse caso, as perdas médias foram de 17% para a Amazônia e 35% para o Cerrado, o que é preocupante já que estas espécies não ocorrem em nenhum outro local.
Cerrado na mira da destruição
O bioma é a savana com maior biodiversidade do planeta, mas também um dos mais ameaçados. Nos últimos dez anos, o Cerrado perdeu 6 milhões de hectares de vegetação nativa, sendo que cerca da metade disso (3,2 milhões de hectares) ocorreu no chamado “Matopiba”, que inclui partes dos Estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.
“Além de já ter perdido mais da metade da sua cobertura original, o que restou no Cerrado encontra-se bastante fragmentado e, em muitos casos, degradado pela ação intensa do homem, criação de gado, fogo recorrente, invasão de espécies exóticas, dentre outros”, avalia Mariana Napolitano, gerente de Ciências do WWF-Brasil. “É essencial a mudança de mentalidade das empresas e do governo: a destruição do ecossistema é desnecessária, pois já existem áreas suficientes para a expansão do agronegócio – que inclusive, já está sendo prejudicado com quebras de safras constantes por conta da degradação ambiental.”
De acordo com Frederico Machado, Líder de Conversão Zero do WWF-Brasil, “o setor privado brasileiro já tem bons exemplos de como ampliar a produção, sem desmatar, e um deles é a Moratória da Soja na Amazônia. Acordo multissetorial que desde a sua assinatura promoveu drástica redução da destruição causada pela soja. É necessário igual comprometimento do setor de soja com o Cerrado, assim como do maior esforço do setor pecuário em não desmatar”.
Os dados do MapBiomas indicam que as principais atividades responsáveis pelo desmatamento e queima do Cerrado e da Amazônia são as produções de gado e soja. Até 2021, a agropecuária já ocupava mais de 40% do Cerrado (23,7% pastagem; 8,9% soja; 7,3% mosaico agricultura e pastagem), e 14% na Amazônia (13,5% pastagem; 1,2% soja) da área original destes biomas.
Detalhes sobre o estudo
O estudo foi realizado pela consultoria Gondwana, sob coordenação do pesquisador Cristiano de Campos Nogueira, e tem o objetivo de apresentar as consequências da perda de vegetação nativa para a biodiversidade do Cerrado e da Amazônia brasileira, além de acrescentar evidências para propor políticas públicas e ações de conservação das espécies destes biomas.
Para calcular o impacto da perda de habitat sobre a biodiversidade, os pesquisadores cruzaram mapas da distribuição de cada uma das espécies (disponíveis no site da IUCN) e os dados de uso do solo para o Cerrado e para a Amazônia (do MapBiomas).