A Lei 12.651, de 25 de maio de 2012, também conhecida como Código Florestal Brasileiro, completa 10 anos de existência na quarta-feira, 25/05. Ela foi criada lá atrás com o propósito de pacificar o campo com a regularização de propriedades rurais e preservação ambiental. Sua implementação é necessária para que os agricultores tenham paz e não vejam suas terras receberem apelidos que envergonham o paraense, como foi o caso de Paragominas, antes conhecida como “Paragobalas” em função dos altos índices de violência associados ao desmatamento.
Se Paragominas tenta hoje virar a página, vários outros municípios do Estado, não. Altamira vive meses de insegurança com degradação ambiental desenfreados, Marabá abriga uma quadrilha de extração ilegal de manganês, São Félix do Xingu testemunhou no início do ano a morte de pai, mãe e filha defensores de tartarugas. O município é conhecido por conflitos fundiários graves resultantes de ações de grilagens de terras públicas, desmatamento ilegal voltado à atividade da pecuária extensiva, invasões de terras indígenas e áreas de preservação, além da instalação de garimpos ilegais. Esses conflitos têm resultado em assassinatos de lideranças, chacinas e trabalho escravo.
A promessa da hidrovia Araguaia-Tocantins, que deve derrocar o Pedral do Lourenço, ameaça ribeirinhos que vivem no local, peixes e vegetação em áreas preservadas. Outros municípios poderiam ser citados, uma vez que, segundo a 36ª edição do relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Estado do Pará liderou o ranking nacional de conflitos por terra em 2021.
Para cobrar das autoridades que o instrumento seja cumprido, é preciso conhecê-lo e ligar lé com cré. O que o Código Florestal Brasileiro influencia diretamente na sua vida? Portanto, nesta semana o Pará Terra Boa publica uma série de matérias sobre o assunto.
O que é o Código Florestal?
A lei regula a exploração de áreas verdes em propriedades rurais. O primeiro passo para a implementação do Código Florestal é o Cadastro Ambiental Rural (CAR). O registro unificado é obrigatório para todas as propriedades rurais do País. Segundo o boletim com os dados do Cadastro Ambiental Rural do Serviço Florestal Brasileiro, 6,5 milhões de imóveis rurais, totalizando uma área de 612.567.861 hectares, estão inseridos na base de dados do sistema.
O registro é autodeclaratório e deveria passar por alguma verificação dos órgãos estaduais, mas segundo os dados do Serviço Florestal Brasileiro, até o dia 11 de abril de 2022, apenas 18,5% passaram por alguma análise e 0,4% foram concluídas.
O texto foi aprovado em 2012 após forte pressão pela flexibilização das leis florestais de 1965, quando ruralistas argumentavam que as leis ambientais eram muito restritivas e impediam a sua efetiva implementação.
Se devidamente implementado, o Código Florestal tem o potencial de conservar mais de 150 milhões de hectares de vegetação nativa no Brasil, responsáveis por armazenar cerca de 100 GtCO2 e pode servir de base para um grande plano de desenvolvimento social e econômico do meio rural.
Quais são as obrigações?
Algumas obrigações previstas no Código Florestal de 1965 foram mantidas e até hoje são os maiores desafios da implementação da nova Lei: a adequação das Áreas de Preservação Permanente (APP) e da Reserva Legal (RL) dos imóveis rurais.
Para adequar-se à lei, os imóveis rurais com déficit de RL e APP e que desmataram até 2008, tiveram regras de transição as quais permitem a adaptação das propriedades rurais aos termos da Lei, por meio de um processo que envolve a inscrição do imóvel rural no CAR.
A nova lei também concedeu diversas anistias para aqueles que não cumpriram a lei anterior, que representam em torno de 41 milhões de hectares de vegetação nativa que deveriam ser restaurados anteriormente (36,5 milhões de ha de RL e 4,5 milhões de ha de APPs). Mas mesmo com todas essas anistias, juntas APPs e RLs somam aproximadamente 21 milhões de hectares que ainda precisam de adequação.
A manutenção da vegetação nativa em APPs deve ser preservada em função de sua localização, tais como rios, nascentes, topos de morro e áreas muito íngremes, e a manutenção de vegetação nativa das Reservas Legais (RL) deve obedecer uma porcentagem do imóvel rural, varia entre 20 a 80% conforme a região em que o imóvel se localiza.
A inscrição no CAR é um pré-requisito para que o produtor rural possa aderir a outra novidade trazida pelo Novo Código Florestal: o Programa de Regularização Ambiental (PRA). O marco legal estabelece as regras genéricas que o PRA deve seguir, mas cada Estado deve regulamentar seu próprio programa, fixando condições específicas. O prazo para inscrição no programa vence em 31 de dezembro de 2022.
CAR sobreposto
Dos 612,5 milhões de hectares que estão inseridos na base de dados do sistema, um total de 12,3 milhões de hectares apresentam sobreposição em terras indígenas, o que é ilegal. Outros 5,6 milhões de hectares são sobrepostos a outros imóveis rurais, principalmente no nosso Pará.
Desses imóveis, 52% solicitaram adesão ao PRA, que prevê a regularização de passivos ambientais de RL e de APP, mas apenas os Estados do Acre, Rondônia, Pará, Mato Grosso, Mato Grosso Do Sul e Bahia já possuem o PRA regulamentado, com validação e adesão de imóveis rurais em andamento.
A grande maioria dos Estados brasileiros estão regulamentados, mas ainda não possuem adesão de imóveis rurais. Rio Grande do Norte, Alagoas e Sergipe são os únicos que ainda não possuem o PRA regulamentado.
Código Florestal no dia a dia
Sabe aquela notícia triste que lemos e vivemos todos os anos no Pará, cada vez de forma mais intensa, de gente desabrigada por conta das cheias? Esse é o reflexo do não cumprimento do Código Florestal.
E esse reflexo é visto por todo o Brasil e mundo afora, em áreas rurais e urbanas.
“Quando tem deslizamento de encosta, quando morrem pessoas soterradas, quando você tem problema de contaminação ou abastecimento de água, enchentes mesmo nas cidades, é a falta de cumprimento do Código Florestal agindo”, explica Beto Mesquita, engenheiro florestal e doutor em Ciências Ambientais e Florestais, em evento nesta manhã de segunda-feira, 23/05, de análise dos 10 anos da legislação.
Ele alerta que o cumprimento do Código “garante não apenas o capital natural que o agronegócio depende, mas também a proteção de nossas próprias vidas”.
Glossário
CAR – O Cadastro Ambiental Rural é um registro eletrônico que possui todas as informações relevantes sobre as características ambientais e áreas de uso dos imóveis. É como o CPF. Você tem o número daquele documento e precisa estar sempre ativo para fazer muitas coisas que envolvem sua identidade, certo? Tudo que envolve suas terras é preciso também estar em dia, formalizado.
APP – Áreas de Preservação Permanente. O Código é o instrumento para manutenção da vegetação nativa em áreas sensíveis que devem ser preservadas em função de sua localização, tais como rios, nascentes, topos de morro e áreas muito íngremes.
RL – Significa Reserva Legal. A manutenção de vegetação nativa em uma porcentagem do imóvel rural, denominada Reserva Legal, varia entre 20 a 80% conforme a região em que o imóvel se localiza.
PRA – Uma coisa é declarar o Imposto de Renda, outra é saber se não caiu na malha fina. O PRA é exatamente isso. Depois do CAR, é preciso concluir a adesão ao Programa de Regularização Ambiental, a ser implementado para a regularização de passivos ambientais de RL ou APP, considerando as condições ambientais específicas de cada Estado.
Segundo a Lei, até 28 de maio de 2032 todo produtor rural deve estar em conformidade com o Código Florestal em todo o Brasil.
Fonte: com Observatório do Código Florestal, CNA, Amazônia.org
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