O Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) apresentou nesta quinta-feira, 6/01, um alerta sobre compra de terra pública a preço abaixo do mercado no Pará. Segundo a instituição, o Decreto Estadual n.º 1.684/2021 de junho do ano passado permite dar um desconto de R$ 6,7 bilhões na privatização de terras estaduais.
Conforme a análise do Imazon, o preço médio final das terras públicas estaduais era de R$ 137 por hectare antes do decreto. Com a mudança, passou para R$ 44, uma redução de 68%. Esse novo valor representa apenas 1,2% do custo médio cobrado por hectare no mercado de terras no Pará, de R$ 3.684.
Com base nesse preço, os pesquisadores calcularam o subsídio ao selecionar 5.450 imóveis rurais de 100 a 2.500 hectares cujo Cadastro Ambiental Rural (CAR) está sobreposto a áreas públicas estaduais ainda sem uso definido. Ou seja: que ainda não foram oficializadas como terras indígenas, territórios quilombolas, unidades de conservação ou até mesmo privatizadas. Segundo os autores da nota, essas terras sem destinação são as preferidas dos grileiros, pessoas que invadem e desmatam ilegalmente florestas públicas para obter a posse das áreas e, posteriormente, lucrar com a venda delas.
Apesar do CAR não representar um documento válido para definição da regularização fundiária, os pesquisadores utilizaram esse dado como uma estimativa.
Conforme a publicação, o cálculo do subsídio corresponde à diferença entre o preço médio de mercado e o que deve ser cobrado pelo governo estadual após o decreto para venda desses 5.450 imóveis, que somam 1,8 milhão de hectares. No mercado, eles seriam vendidos em média por R$ 6,797 bilhões. Já pelo governo, o valor cobrado pelo novo decreto é estimado em R$ 95 milhões.
Isso significa que, com a nova regra, o subsídio em relação ao preço de mercado chega a R$ 6,702 bilhões. Apenas comparando o preço cobrado pelo Estado antes e depois do decreto, o valor que deixaria de ser arrecadado com a privatização dessas áreas é de R$ 247 milhões.
“Não se combate o desmatamento aplicando os mesmos incentivos que historicamente contribuíram com a ocupação ilegal e a destruição da floresta para a comprovar posse das terras públicas. Enquanto houver a expectativa de legalização dessas áreas públicas invadidas e devastadas, seguida de altos lucros dos invasores com a venda delas quando privatizadas, continuaremos assistindo esse ciclo de grilagem. O caso paraense é, infelizmente, mais um exemplo dessa prática de desvalorização de terras públicas que observamos na Amazônia”, afirma a pesquisadora do Imazon Brenda Brito, coordenadora da nota técnica.
Recomendações
Os autores da nota técnica recomendam que o Estado passe a cobrar o valor de mercado para a privatização de terras públicas. Caso contrário, novas invasões e desmatamentos ilegais devem seguir acontecendo, incentivados pela especulação imobiliária: a manutenção do chamado “ciclo da grilagem” citado pela pesquisadora.
Outra recomendação da nota é que o Pará passe a exigir de todos que solicitam a posse de terras estaduais que foram desmatadas ilegalmente a oficialização, antes da venda, de um compromisso para a regularização ambiental das áreas. Tal medida, conforme os pesquisadores, facilitará a fiscalização e agilizará a cobrança e a punição em caso de descumprimento do acordo.
Dos nove estados que integram a Amazônia Legal, apenas o Pará foi responsável por 40% dos alertas de desmatamento de janeiro a novembro de 2021. Segundo o monitoramento do Imazon por imagens de satélite, dos 10.222 km² de mata nativa destruídos na região, 3.992 km² ficam no Pará.
O Pará Terra Boa solicitou uma posição do governo estadual e atualizará esse texto assim que a resposta for recebida. Ao jornal “O Globo”, o governo estadual afirmou em nota que a medida é “um avanço para contribuir na regularização fundiária do produtor rural e do agricultor familiar que cumprem os requisitos legais”. Acrescentou que “o Estado entende que não promover a regularização fundiária daqueles que cumprem os requisitos legais é uma característica de poder público ausente e, consequentemente, estímulo a grilagem, desmatamento e demais crimes ambientais”.
Fonte: Imazon