Os efeitos da forte seca na região amazônica chamam a atenção do mundo, desde o final de setembro, quando os primeiros relatos e imagens da estiagem começaram a ser divulgados. Os registros de cursos d’água vazios, o isolamento de comunidades ou da morte de botos e outros animais são os impactos mais evidentes, mas a ciência já sabe que os eventos extremos tendem a provocar danos diversos para o meio ambiente.
Os pesquisadores da Universidade do Estado de Mato Grosso Beatriz Schwantes Marimon e Ben Hur Marimon Jr atuam em áreas ao sul da Amazônia, onde não houve redução da vazão dos rios. Ainda assim, as investigações realizadas por eles nos últimos 30 anos mostram que a combinação de ondas de calor, desmatamento, queimadas e mudanças climáticas é capaz de interferir no equilíbrio de todo o bioma.
A região estudada apresenta características de transição para o Cerrado e é muito ocupada pela agricultura. Lá, as principais preocupações são com as repercussões do El Niño, que levou à falta de chuvas e a consequente redução da atividade econômica.
“As chuvas deveriam ter começado em setembro e, em outubro, seria a época do início do plantio. Mas o atraso das chuvas não permitiu isso e pode fazer com que se perca a safrinha, que é o segundo plantio que é feito tradicionalmente”, disse Ben Hur em entrevista à WWF Brasil.
Além disso, os pesquisadores dizem que a população e organismos têm sofrido com as altas temperaturas, que atinge picos de até 40º. Nesse cenário, eles também chamam atenção para o risco de rebaixamento do lençol freático, que é reabastecido suficientemente durante a época das chuvas. Com isso, a projeção é que os efeitos da seca se prolonguem até o próximo verão amazônico, em 2024.
Beatriz Marimon esclarece que uma condição climática tão exigente pode afetar a saúde da floresta nos médio e longo prazos. Um dos efeitos é a morte de árvores maiores, que protegem o solo e outras espécies do contato intenso com os raios solares. Caso essas árvores tombem, abre-se espaço para invasão de gramíneas, que fornecem combustível mais rápido para a propagação das queimadas.
“As árvores de grande porte levam em torno de dois anos para morrer, porque elas têm reservas, suas raízes são profundas e conseguem acessar a água. Por isso, não vemos tantas delas morrendo imediatamente. Mas, com o rebaixamento do lençol freático, depois de dois anos, o estresse é tão grande que a árvore não suporta”, comenta a pesquisadora.
De acordo com Bem Hur, a perda das árvores maiores provoca um efeito dominó marcado pela degradação total da floresta. Isso já seria facilmente constatado na região sul da Amazônia, onde a mortalidade de vegetais já é alta e se observa a redução da biodiversidade de maneira generalizada.
“”Normalmente, quando a floresta perde biomassa, recupera naturalmente mais tarde e o equilíbrio de todo o bioma se mantém. Mas quanto maior é o número de árvores perdidas, maior é a perda de sombreamento. Isso intensifica os efeitos da seca e reduz ainda mais o nível de chuvas, o que tende a agravar toda a situação. É um efeito dominó que pode atingir níveis inimagináveis”, acrescenta o professor.