Por Fabrício Queiroz
O acesso à água é essencial para os seres vivos e para a manutenção de muitas atividades, como a agricultura e a pecuária. Em razão disso, as matas ciliares, que abrangem as áreas de vegetação próximas aos rios, nascentes e açudes, costumam ser derrubadas e ocupadas com moradias e até empreendimentos, o que vai contra o Código Florestal Brasileiro.
Alguns produtores rurais podem considerar as matas ciliares como um empecilho para o desenvolvimento de atividades seja de plantio ou de pasto. A verdade, no entanto, é que a devastação dessas áreas traz uma série de prejuízos, como o risco maior de processos erosivos e de contaminação da fonte d’água que serve tanto para os seres humanos quanto para espécies da fauna e da flora.
Apesar disso, essas áreas continuam sofrendo com os impactos de ações humanas, como o desmatamento e as queimadas, o que acaba gerando passivos ambientais difíceis de serem reparados, principalmente por pequenos produtores rurais. Na semana em que se comemora o Dia Mundial da Água, o Pará Terra Boa destaca o trabalho da Embrapa Amazônia Oriental, que desenvolve o projeto Inovação em Restauração Florestal e Recuperação de Áreas Degradadas (InovaFlora) em quatro municípios do sudeste paraense.
O trabalho é financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por meio do Fundo Amazônia, e tem o objetivo de apoiar agricultores familiares no processo de adequação de suas propriedades à legislação ambiental. As ações envolvem a disseminação de informações sobre estratégias produtivas e de restauração ecológica para áreas de Reserva Legal (RL) e de Preservação Permanente (APP), que contemplam as matas ciliares, classificadas como APP pela lei.
A agenda de capacitações realizadas abrangeu os municípios de Novo Repartimento, Itupiranga, Marabá e Ipixuna do Pará e, posteriormente, o assentamento Mamui, em Itupiranga, e a zonra rural de Novo Repartimento receberam a implantação de Unidades de Referência Tecnológicas (URTs) que servem de vitrine e experimentação das práticas de recuperação.
Michelliny Bentes, pesquisadora da Embrapa e coordenadora do InovaFlora, explica que o projeto se baseia em uma abordagem participativa, estabelecendo diálogos com os produtores que puderam apresentar suas demandas e selecionar as espécies de interesse para a restauração, privilegiando árvores nativas, como o taperabazeiro, a andirobeira e diferentes variedades de angico.
“O açaí foi uma das espécies que os produtores demonstraram interesse tanto pela possibilidade de consumo quanto para a venda. É uma cultura muito valorizada e que permite que eles entrem em um mercado que está cada vez mais em alta”, pontua.
Apesar do açaí produzir os primeiros frutos somente a partir do quarto ano, a pesquisadora afirma as cerca de 10 famílias atendidas nessa fase piloto estão satisfeitas com os resultados alcançados. Isso porque, além da recuperação das APP, foi incentivada a adoção de tecnologias como os sistemas agroflorestais, que permitem a recomposição da vegetação e ganhos produtivos com as safras de diferentes culturas, como a banana, o cacau e a mandioca
“Estimulamos um manejo não destrutivo que traz uma série de repercussões ambientais. Quando se maneja bem a APP, você observa o aumento da biodiversidade, do fluxo gênico, das espécies de flora que geram um bem-estar geral. Visualmente se nota o aumento do volume de água em cerca de um ano de restauração porque as raízes das plantas conseguem bombear mais água do lençol freático naquela área que antes estava degradada”, comenta Michelliny Bentes.
Para a pesquisadora, é importante que os produtores vejam a proteção das matas ciliares não apenas como uma exigência da lei, mas que a conservação dessas áreas também é benéfica para o desenvolvimento da agricultura familiar.
“É interessante fazer a relação das APPs como protetora das nascentes e fontes hídricas da propriedade, pois elas favorecem a existência de água que é essencial para as atividades produtivas”, ressalta.