Por Fabrício Queiroz
As práticas e as estratégias de investimento em bioeconomia foram alguns dos temas debatidos no evento “Inovação, Finanças e Natureza”, realizado nesta quinta-feira, 10, em Belém. A necessidade de alinhamento da dinâmica da oferta de crédito com as demandas e interesses das comunidades da região amazônica esteve no centro da discussão que envolveu representes de populações indígenas, academia, instituições financeiras e empresas.
Francisco Piyãko, líder do povo Ashaninka, do estado do Acre, que foi o primeiro grupo a acessar diretamente os recursos do Fundo Amazônia, saudou o interesse crescente pelo incentivo às atividades que promovem a conservação da floresta. Contudo, ele relatou que ainda há preocupação com a imposição de modelos de desenvolvimento que não dialogam com essa perspectiva.
“A gente fica muito feliz quando vê que o nosso rio está com água limpa, quando vê que a floresta está em pé, que ali dentro se tem os meios para viver da floresta, quando nossos conhecimentos estão vivos. Essa Amazônia tem uma lógica bem diferente de bem estar e desenvolvimento”, afirmou a liderança, que completou: “Precisamos falar de preservar a Amazônia porque ela tem outro valor para a humanidade e para o mundo. Isso precisa ficar claro para nós”.
Para que esse valor intrínseco à Amazônia seja valorizado, o desenvolvimento científico e tecnológico foi apontado como uma das formas capazes de prover as populações e o poder público de soluções que contribuem para o reconhecimento dessa importância.
Nesse sentido, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) destacou a variedade do seu portfólio de projetos e laboratórios ativos, que já promovem conhecimentos sobre manejo de açaí, sistemas agroflorestais, agregação de valor à sociobiodiversidade, entre outros temas.
O chefe da Assessoria de Relações Internacionais da Embrapa, Marcelo Morandi, ressaltou que, com apoio, essas tecnologias podem ser escaláveis e, assim, podem alcançar e beneficiar diferentes agentes da região.
“Temos que ter diferentes estratégias com vários caminhos que tragam essa leitura da identidade territorial e da geração de riqueza com base na conservação. A nosso ver, existem três eixos básicos para desenvolvimento da bioeconomia: um é por meio da Amazônia conservada, outro é com a bioeconomia de base florestal e, ainda, com a agrobioeconomia, pensando as atividades que podem ser realizadas nas áreas convertidas”, esclareceu o pesquisador.
Fundos de investimento
Ao longo do painel, foram apresentados também ações empreendidas pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), pela instituição da Colômbia Terrasos e pela gestora de recursos JGP Asset Management, que está atuando na Amazônia.
José Pugas, sócio e head de investimento responsável e engajamento da JGP, avaliou que ainda há um desafio para a construção de um “dialeto comum entre o que já existe na região e o mercado de capitais”.
Apesar da dinâmica distinta entre os dois setores, Pugas considera que o fundo que ele coordena já conquistou avanços importantes nos 18 meses de atuação, financiando projetos com produtos florestais não madeireiros na região. Entre esses produtos estão: açaí, cacau e babaçu.
“A gente saiu de um investimento total em projetos de R$ 5 milhões e, hoje, tem projetos de R$ 150 milhões, sendo que somente aqui no Pará nós temos mais de R$ 100 milhões investidos apenas nos últimos 12 meses”, destacou.
O empresário demonstrou confiança no impacto dessa perspectiva a longo prazo.
“Nós temos que admitir que o nosso modelo de desenvolvimento falhou miseravelmente e que precisamos aprender com os povos daqui e atuar para proteger a biodiversidade não para o século XXI, mas para os séculos XXII, XXIII e assim por diante”.
O evento “Inovação, Finanças e Natureza” promoveu ainda debates sobre economia global da natureza, tecnologia e inovação na bioeconomia, o papel dos bancos de desenvolvimento no fomento à bioeconomia, além de um painel com representantes dos governos da Amazônia Legal.
Na parte da manhã, foi lançado o “Colocando os mercados de natureza para funcionar: como moldar uma economia global da natureza no século 21”, um relatório idealizado por diversas lideranças políticas, indígenas, empresariais e financeiras para redesenhar os mercados globais, com sete recomendações.