A Serra dos Carajás, conhecida internacionalmente por abrigar a maior mina de minério de ferro a céu aberto do mundo, se transformou em um novo epicentro da mineração ilegal no Brasil. Há três anos, a Agência Nacional de Mineração (AMN) identificou a região como uma oportunidade de investimento para futuras áreas disponíveis por meio de processos minerários caducados, renunciados ou desistidos.
O resultado é a invasão dos municípios de Marabá, Canaã dos Carajás, Curionópolis e Parauapebas por inúmeros mineradores ilegais em busca de ouro, cobre e manganês, segundo O Globo.
Somente nos quatro municípios mais afetados pela mineração ilegal, a Vale possui 13 permissões para explorar depósitos de cobre, ouro e manganês. A AMN concedeu à empresa um total de 87 autorizações de pesquisa, principalmente para cobre e ouro, e sete para manganês. Algumas das permissões mais antigas datam do final dos anos 80, mas também existem processos mais recentes, de 2021 e 2022.
“A terra extremamente rica atrai incontáveis grupos criminosos. Temos pontos de mineração ilegal em quintais de casas, lotes arrendados e até mesmo a ação de quadrilhas que, com uso de armas de fogo, expulsam famílias de posseiros e pequenos proprietários. Há ainda os que arrendam suas terras e recebem 20% do valor do mineral extraído, afirma Ezequias Martins, delegado da Polícia Federal em Marabá, responsável por 22 municípios da região, ao jornal.
Como já publicamos aqui no Pará Terra Boa, desde 2016, o município de Canaã dos Carajás experimenta um crescimento econômico sem precedentes, atingindo o PIB de R$ 22 bilhões em 2020. Com a abundância, o garimpo clandestino de cobre e ouro tem avançado nas proximidades.
Enquanto a extração de ouro é concentrada no leito e nas margens dos rios, a de cobre envolve a abertura de galerias em profundidades de 40 a 120 metros, o que representa um grande risco para o setor elétrico.
De 2022 para cá, a Polícia Federal (PF) realizou quatro operações na região, sendo uma em Marabá, duas em Canaã do Carajás e uma em Curionópolis. Nesta última, ocorreu o sequestro de R$ 161 milhões e o bloqueio de R$ 200 milhões referentes ao valor de avaliação de uma fazenda. No local, passa a Linha de Transmissão Xingu-Rio, responsável por levar energia ao Sudeste do país.
“Guias de utilização”
De acordo com o procurador Igor Lima Goettenauer de Oliveira, do Ministério Público do Pará, o tráfico intenso de cobre e manganês ilegais na região tem se beneficiado das “guias de utilização” concedidas pela ANM durante a fase de autorização de pesquisas minerais. Antes de obter a concessão para a extração, é permitido vender uma pequena quantidade do material extraído para “custear” parte da pesquisa.
‘’É fácil saber onde estão os minérios. As comunidades sabem onde eles estão e muitos trabalhadores aceitam ser explorados e até defendem a mineração por falta de opção. O que mais tem aqui são fazendas de criação de boi e soja, que empregam poucas pessoas. Nessa realidade, a mineração ilegal paga até melhor do que os demais empregadores’’, explicou o procurador.
Como a exploração do solo é uma competência da União, é responsabilidade do governo federal criar estruturas de fiscalização e monitoramento. Na região de Carajás, segundo o procurador, até mesmo áreas que pertencem à Vale e que são reservas para exploração futura estão sendo invadidas.
Ele afirma que as operações policiais são difíceis de serem planejadas, já que a rede de empresários, comerciantes e trabalhadores que atua nos diversos pontos ilegais de exploração possui até mesmo “olheiros” que observam a movimentação das viaturas oficiais.
Em nota, a Vale informou que tem reforçado o monitoramento de suas áreas e denuncia à ANM lavras ilegais em títulos minerários da companhia, além de colaborar com as autoridades fornecendo dados requisitados para apuração de atividades clandestinas.
“A prática, além de configurar crime, impõe drásticos impactos ao meio ambiente, aos cofres públicos, à segurança e à atração de investimentos e implantação de novos empreendimentos”, diz a Vale.