O garimpo ilegal deixa rastros de destruição na floresta amazônica, avançando principalmente sobre Unidades de Conservação (UCs) e Terras Indígenas (Tis). A utilização de maquinário pesado e caro tem se alastrado na região, conforme investigação realizada pela Repórter Brasil com base nos dados do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) sobre a apreensão de retroescavadeiras.
No período entre abril de 2023 a abril deste ano, 90 máquinas foram apreendidas na Amazônia, sendo que 34 delas estavam sendo operadas em UCs do Pará, em um raio de até 390 km do município de Itaituba. As áreas afetadas são a Estação Ecológica Alto Maués, as Florestas Nacionais do Jurupari, Crepori e Amaná e a Área de Proteção Ambiental (APA) Tapajós. As duas últimas figuram como as unidades de conservação com as maiores áreas de garimpo, segundo levantamento do MapBiomas de 2022.
A empresa sul-coreana Hyundai Construction Equipment foi a campeã da lista de apreensões com pelo menos 26 retroescavadeiras detidas entre abril de 2023 e 2024. Em segundo vem a estadunidense Caterpillar, com 13 máquinas detidas no período.
“As máquinas da Hyundai não servem só para os fazendeiros e para a construção civil, servem para destruir a floresta”, alerta Doto Takak Ire, presidente do Instituto Kabu e membro da Aliança dos Povos Contra o Garimpo.
A preocupação com o maquinário utilizado se justifica pelo grande impacto causado. Isso porque uma escavadeira é capaz de realizar em 24 horas o mesmo trabalho que três homens levariam 40 dias. Apesar dos danos evidentes, não há qualquer controle para evitar que esses equipamentos sejam usados na destruição da floresta.
“O comércio dessas máquinas é livre, não tem nenhum tipo de restrição. Não tem controle nenhum e isso é incompatível com a importância que exercem nas atividades ilegais na Amazônia”, comenta Felipe Finger, coordenador do Grupo Especial de Fiscalização do Ibama.
Alerta dos indígenas
A organização que articula os povos Kayapó, Munduruku e Yanomami para combater a atividade ilegal já denunciou a situação à própria fabricante no ano passado, depois que 75 máquinas da marca foram flagradas nos territórios indígenas. De lá para cá, a situação só piora com o crescimento dos casos de contaminação por mercúrio, a exemplo do drama vivido pelos indígenas Munduruku na bacia do Tapajós, no Pará.
“A contaminação realmente está pegando todo mundo. Muita gente já está perdendo crianças ou elas nascem deficientes por conta do mercúrio. Estamos preocupados com as futuras gerações”, denuncia Doto Takak Ire.
Para quem acompanha de perto o impacto do garimpo ilegal na Amazônia, o comércio de retroescavadeiras mostra que há grandes redes profissionalizadas e capitalizadas por trás da atividade. Cada máquina nova custa entre R$ 800 mil e R$ 1,5 milhão, enquanto que uma usada é vendida por cerca de R$ 200 mil. No total, a reportagem estima que o valor dos 90 equipamentos pode chegar a R$ 41,6 milhões.
Uma solução para isso pode vir da iniciativa das próprias indústrias, que podem adotar um programa denominado “Código de Consciência”, que quando inserido no computador de bordo do equipamento emite um alerta caso seja detectada a sua presença dentro de uma área protegida. Ainda a tecnologia esteja disponível, a adesão ao recurso ainda é tímida.
Em resposta à reportagem, a Hyundai informou que averigua a idoneidade dos clientes e bloqueia de imediato consumidores suspeitos de envolvimento com garimpo ilegal. Segundo a companhia, informações e documentos sobre os compradores são fornecidos às autoridades sempre que solicitado. As demais empresas citadas na matéria afirmaram que a responsabilidade das atividades desempenhadas com as máquinas é do cliente.