A Revista Globo Rural revelou nesta terça-feira, 19/04, que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) favoreceu a mineradora canadense Belo Sun para exploração de ouro em Senador José Porfírio (PA). De maneira irregular, cedeu uma área de 2,43 mil hectares, que deveria ser destinada para o assentamento de agricultores familiares.
De acordo Elisângela Machado Côrtes, defensora de Direitos Humanos no Pará e autora de interdito proibitório (mecanismo processual de defesa da posse) contra a mineradora, o Incra estaria exercendo uma função de defesa da mineradora. Isso depois de denúncias de que a empresa estaria ameaçando os agricultores familiares na região de Volta Grande do Xingu, no coração da Amazônia.
“O que a gente identificou é que em momento algum o Incra exerceu essa função de defender o assentamento e a reforma agrária. Nos parece que ele tem agido muito nesse caso como se fosse um particular.”
“A Belo Sun colocou uma segurança armada na região e a gente recebeu vários relatos de que essa segurança armada tem maltratado e ameaçado os moradores, falando que o empreendimento vai sair de qualquer jeito. Então as pessoas ficam com muito medo, principalmente depois que essa segurança armada foi colocada lá”, conta a defensora.
Antes de firmar o contrato com o Incra, a Belo Sun já estava adquirindo terras públicas de forma irregular na região, comprando diretamente de assentados – o que configura crime. Essa prática é alvo de outra ação, movida pela Defensoria Pública do Estado do Pará.
Ainda conforme disse a defensora pública, tudo ocorreu como se fosse uma relação de compra de um terreno de maneira regular e com o consentimento do Incra.
“Como é que o Incra aceita isso e em momento algum censurou esse comportamento da Belo Sun? Apenas acatou essa compra, e depois é como se a Belo Sun estivesse ainda sendo premiada com a celebração do contrato”, critica Elisângela.
Em seu site, a Belo Sun afirma que possui autorização para a exploração de 160 mil hectares na região e que os trabalhos preliminares de exploração identificaram “inúmeras ocorrências de ouro e possíveis alvos futuros de crescimento que serão sistematicamente perfurados e explorados”.
Área já devastada
A consultora jurídica da Amazon Watch, Ana Carolina Alfinito, lembra que a região de Volta Grande do Xingu é uma área que já enfrenta impactos ambientais de outra grande obra, a usina de Belo Monte.
A instalação da hidrelétrica, afirma a ambientalista, tem reduzido a vazão do rio Xingu e de seus afluentes, comprometendo a fauna, a flora e as atividades extrativistas das comunidades tradicionais, que dependem dessa bacia hidrográfica.
“A gente precisa esperar no mínimo alguns anos para ver quais vão ser os impactos e o que esse ambiente suporta sem entrar em colapso porque ele já está entrando em colapso”, alerta Ana.
Ironia ou não, o impacto de Belo Monte sobre a vazão do Xingu torna ainda mais conveniente a mineração da região.
“Para quem quer minerar ouro, lavrar minério, é melhor que esteja mais seco mesmo. Isso baixa o nível de agua e aquele minério se torna mais acessível, tem que drenar menos o solo e as aguas subterrâneas para acessar esse minério”, explica a consultora jurídica da Amazon Watch.
Posicionamento do Incra
Procurado, o Incra confirmou que o seu Conselho Diretor referendou o contrato de concessão de uso de 2.428 hectares para a empresa Belo Sun Mineração Ltda, firmado em 26/11/2021, após a empresa obter autorização para instalar empreendimento minerário por parte da Agência Nacional de Mineração e órgão ambiental.
Segundo o Incra, a autorização de uso refere-se a uma área que representa cerca de 3,5% do projeto e não haverá retirada de famílias assentadas, “por inexistirem beneficiários da reforma agrária no local que será afetado pelo empreendimento”.
“No caso da área cedida na Gleba Ituna, a empresa deve identificar eventuais ocupantes e apresentar plano de remanejamento e indenização”, afirma o Incra em nota.
O que diz a mineradora?
Já a mineradora Belo Sun destacou em nota que seu projeto está com a Licença de Instalação (LI) suspensa pelo Tribunal Regional Federal (TRF-1) e que o licenciamento segue todos os ritos pertinentes.
“A empresa está sempre à disposição das comunidades, entidades e órgãos envolvidos no processo de licenciamento e reforça seu compromisso com a região da Volta Grande do Xingu, respeitando a legislação brasileira nos âmbitos federal, estadual e municipal”, afirma a Belo Sun.
Vale-tudo
Você já deve ter lido aqui no Pará Terra Boa, que o ‘Projeto da mineradora canadense Belo Sun na Amazônia conta com lobby de general da reserva’, e com um grupo formado por executivos do banco canadense Forbes & Manhattan (F&M) com o objetivo de tentar liberar licenciamentos ambientais de suas mineradoras na Amazônia, entre elas a Belo Sun e a Potássio do Brasil.
As duas mineradoras impactam assentados, indígenas e ribeirinhos, no Amazonas e no Pará. O texto teve como base uma reportagem no site da Agência Pública.
Saiba mais sobre o projeto da Belo Sun aqui.
Fontes: Revista Globo Rural e Agência Pública
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