Nesta terça, 24, o UOL divulgou relatos de indígenas munduruku da aldeia Sawré Muybu afetados pela contaminação de mercúrio. A substância usada pelo garimpo ilegal tem provocado mudanças drásticas no modo de vida da população: as mulheres temem engravidar e o peixe, por ser estar contaminado, passou a ser consumido apenas duas vezes por mês dentro de várias aldeias.
Em novembro de 2020, a Fiocruz e o WWF-Brasil divulgaram um estudo que analisou fios de cabelo de 200 indígenas de três aldeias mundurukus nos municípios de Itaituba e Trairão, verificando que todos apresentavam algum grau de mercúrio no organismo.
De cada 10 participantes do levantamento, 6 apresentaram níveis de mercúrio acima de limites seguros: cerca de 57,9% deles apresentaram níveis de contaminação acima de 6µg.g-1 – que é o limite máximo de segurança estabelecido por agências de saúde.
Em setembro do ano passado, o resultado foi apresentado à Aldeia Sawré Muybu em uma assembleia, pouco antes do primeiro turno da eleição. Agora, cercados de uma água de coloração branca, crianças e adultos sofrem as consequências da exploração em suas terras.
“É a lama do garimpo”, disse Alessandra Munduruku.
Consequências
O acúmulo de mercúrio no organismo afeta diretamente o Sistema Nervoso Central, que está em desenvolvimento nas crianças menores de 5 anos, e o cérebro dos fetos ainda em formação no útero materno. Também provoca déficits de sensibilidade térmica, quando a pele não percebe, por exemplo, temperaturas altas.
Nas crianças, o mercúrio causa problemas motores e na fala. Nos bebês de até 12 meses, anemia. No feto, além da má-formação, danos aos rins e problemas no Quociente de Inteligência (QI) de forma irreversível.
Ao UOL, a líder indígena Maria Leusa, que já teve sua casa queimada por garimpeiros, descobriu que seu leite materno está contaminado pelo mercúrio, prejudicando a saúde de seu filho.
“A gente está morrendo sem perceber. O que a gente vai comer agora? O que as grávidas vão dar pros seus filhos se não for o leite ou peixe? A gente vai morrer de fome”, disse ela.
Contaminação maior em áreas de garimpo
A contaminação foi maior em áreas mais impactadas pelo garimpo, nas aldeias que ficam às margens dos rios afetados. Nessas localidades, 9 em cada 10 participantes apresentaram alto nível de contaminação.
Segundo o UOL, a indígena Aldira Akai relatou sentir dores de cabeça, no corpo e episódios de esquecimento. O laudo que recebeu indica 8,9 mg de mercúrio por grama de cabelo. O número é considerado alto na tabela da Fiocruz.
Em março de 2022, o cacique Juarez Saw Munduruku relatou ao Pará Terra Boa que uma indígena teve um aborto espontâneo em que o feto saiu com má-formação.
“Agora teve um aborto aqui de uma jovem e ninguém sabe. A criança não se formou, saiu deficiente. Todo mundo viu que não era criança formada, era destransformada. A gente acredita que é por causa do mercúrio”, denunciou.