Mais da metade das terras firmes da Amazônia são áreas pouco estudadas pela ciência. Os vazios de conhecimento sobre a biodiversidade nesses locais é infinitamente menor em relação às zonas úmidas e aos ecossistemas aquáticos da região. Pra ser mais exato, eles correspondem a 54,1% das áreas de terra firme, 27,3% dos habitats aquáticos e 17,3% das áreas úmidas (várzeas).
Essa lacuna sobre a biodiversidade amazônica é um dos principais resultados de um mapeamento da pesquisa ecológica em toda a Amazônia brasileira realizada por cientistas de instituições do Brasil e de outros países que integram e sintetizam informações sobre estudos da biodiversidade amazônica.
Publicado na Current biology pelo projeto Synergize, do Centro de Síntese em Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos do CNPq, o estudo identificou os fatores logísticos, como a disponibilidade de meios de transporte e a distância em relação a grandes cidades e centros de pesquisa, como os principais influenciadores na escolha das áreas de pesquisa.
O modelo utilizado no estudo revelou ainda que cerca de 15% das áreas com menor probabilidade de serem pesquisadas estão sujeitas a sofrer severas alterações até 2050, em decorrência das mudanças climáticas e outras formas de degradação causadas pela atividade humana na região.
Essa falta de pesquisa e conhecimento nessas áreas tem impactos significativos. Além da perda da biodiversidade e dos benefícios que ela proporciona para as pessoas, também estamos perdendo a oportunidade de entender como os organismos desses ecossistemas estão reagindo às mudanças climáticas e à degradação ambiental.
Mario Moura, especialista em lacunas de conhecimento sobre biodiversidade e autor do artigo, destacou a o ((eco)) a importância de entender como a biodiversidade da Amazônia responde às mudanças para termos uma referência no futuro. No entanto, a ausência de pesquisas adequadas dificulta essa compreensão, pois não temos um ponto de comparação do que era o ecossistema antes e como está agora.
“Para entender como a biodiversidade da Amazônia vai responder [às mudanças], precisamos entender como ela está organizada hoje. Assim, no futuro, quando alguma mudança acontecer, vamos ter com o quê comparar”, explica ele. “Precisamos falar de um antes e um depois, e nesse momento a gente não sabe nenhum dos dois: o depois já está chegando e o antes ainda não foi construído”, lamenta Moura, que é professor visitante da Unicamp (Universidade de Campinas).
De acordo com a Embrapa, para compreender melhor a situação das pesquisas ecológicas na Amazônia brasileira e fazer recomendações a tomadores de decisão, o grupo de pesquisadores do Synergize realizou um estudo adicional sobre investimentos em pesquisas na região. As recomendações estão organizadas em um sumário para políticas (policy brief) intitulado Como superar os desafios que limitam as pesquisas ecológicas na Amazônia e disponível no website do Centro SinBiose.
“Os resultados desse estudo são importantes para orientar ações mais estratégicas de fomento às pesquisas na Amazônia, especialmente neste momento em que a reunião dos chefes de Estado da Amazônia Legal – a Cúpula da Amazônia – se aproxima. Nossos estudos apontam que não basta apenas aumentar os recursos disponíveis; é necessário uma alocação bastante estratégica por parte dos tomadores de decisão”, finaliza Joice Ferreira.