Por Fabrício Queiroz
O inverno amazônico é o período de safra do cupuaçu, uma fruta típica da região e que conquista paladares pelo seu sabor único. A mistura de notas azedas e agridoces torna o fruto um ingrediente diferenciado na preparação de doces, geleias, sucos, cremes, sorvetes, e sua amêndoa é base até para a produção do chamado cupulate. Toda essa versatilidade ainda é aliada de processos de recuperação florestal no estado do Pará.
O cultivo do cupuaçu em sistemas agroflorestais (SAFs) é uma das ações recomendadas pelo projeto Floresta Para Sempre, do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), para a restauração de áreas de mata ciliar e de reserva legal nos municípios de Ulianópolis, Dom Eliseu, Capitão Poço e Paragominas, no nordeste do estado.
A iniciativa tem o apoio do Fundo Amazônia e visa o desenvolvimento cientifico, da agricultura familiar e da assistência técnica em modelos de SAF direcionados para o tema da restauração. Isso porque a organização detectou que o histórico de ocupação da região deixou um rastro de devastação impulsionado pela falta de orientação para o uso adequado da terra em atividades como a agricultura e a pecuária de pequeno porte.
De acordo com a pesquisadora do Imazon, Andreia Pinto, o público-alvo foram agricultores de áreas de assentamento, onde já havia um histórico de degradação decorrente da criação de gado para subsistência ou da abertura de roças em terrenos sem aptidão para a agricultura.
Em razão desse processo, as propriedades apresentavam características como solo compactado e com gramíneas que dificultam o crescimento de outras culturas. A estratégia para solucionar esse problema foi buscar espécies florestais nativas com crescimento rápido e que pudessem gerar sombreamento, facilitando o cultivo de outras variedades de plantas. Assim, o Floresta Para Sempre apostou no potencial e nas vantagens oferecidas pelo cupuaçu.
“O cupuaçu é uma planta que, dependendo da genética e dos tratamentos adequados, começa a dar frutos do segundo ao quarto ano após o plantio, oferecendo uma produção perene. Também é uma espécie melhor adaptada às condições climáticas e do solo da região, além de que o Código Florestal permite que essa espécie possa ser usada de forma consorciada para a recuperação de área de reserva legal e até de mata ciliar. Esse conjunto de vantagens é muito bem-vindo”, comenta Andreia Pinto.
Os primeiros plantios
Os primeiros plantios de SAFs foram feitos a partir de 2022 por 136 agricultores de Ulianópolis, Dom Eliseu e Capitão Poço, que receberam capacitação e 56.200 mil mudas de cupuaçu e outras espécies, como o açaí, o miriti, o cacau e o jenipapo. No total, 102 hectares já foram restaurados, mas a expectativa é que os números e o impacto do projeto aumentem, já que outros 64 produtores de Paragominas devem começar os cultivos neste ano.
Para a pesquisadora, os resultados alcançados até então são animadores visto que a estratégia de recuperação florestal com cupuaçu atende a demandas dos agricultores que podem contar com uma cultura valiosa para o mercado e para a segurança alimentar das populações locais, mas também para a agenda climática, oferecendo uma solução prática para o aumento da absorção de carbono, por exemplo.
Nesse sentido, Andreia Pinto ressalta que a experiência contribui para o planejamento e implementação de ações necessárias para que o Brasil alcance a meta de recuperação de 40 milhões de hectares em uma década, conforme a previsão do Plano Nacional de Conversão de Pastagens Degradadas (PNCPD).
“Experiências piloto como essa servem para inspirar contingentes maiores de produtores nesse tipo de prática. Já conseguimos mobilizar 64 produtores em Paragominas e temos uma perspectiva crescente de aumentar os imóveis rurais atendidos. O nosso trabalho é voltado para a necessidade dos pequenos agricultores, mas é um modelo que pode ser aproveitado também em médios e grandes imóveis rurais”, destaca a pesquisadora.