O garimpo ilegal não está somente nas águas do Rio Tapajós em Alter do Chão (PA), conforme comprovado em laudo da Polícia Federal divulgado na quarta-feira, 16/02. Ele avança também sobre os núcleos de poder de Brasília. Nesta semana, enquanto a PF executava operação contra a atividade ilegal nas proximidades do Território Indígena Munduruku em nosso Estado, um representante do povo paraense na política atuava sem cerimônias em Brasília, exibindo-se em redes sociais, a favor dos garimpeiros.
Era o deputado José Priante (MDB-PA), ao lado do prefeito de Itaituba, Valmir Climaco (MDB), dizendo que acabara de conversar com o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), para tratar do que chamou de “espetáculo de horror” contra os garimpeiros por meio da queima de equipamentos apreendidos pela PF em operações contra a atividade ilegal.
O paraense sabe que Priante é primo do pai de nosso governador, bem como também está por dentro, tendo lido aqui no Pará Terra Boa, que o vice de Valmir na prefeitura de Itaituba, Valmar Kaba Munduruku (Republicanos), foi condenado pela Justiça a quatro anos e um mês de prisão em regime inicial semiaberto por coação no curso de um processo. Ele é acusado de agir como um dos líderes de um protesto violento contra uma operação de combate à mineração ilegal no município.
No mesmo dia da pressão política em Brasília, longe dali, os garimpeiros mais uma vez desafiavam o poder público imbuído de fiscalizar a exploração ilegal de ouro, com a queima de duas pontes de madeira e bloqueio à sede do Instituto Chico Mendes (ICMBio), em Itaituba, às margens do Rio Tapajós, região que é um dos maiores polos de garimpo ilegal do Brasil. Sem falar em helicóptero queimado do Ibama a mando de um garimpeiro milionário, segundo suspeitas da PF, outro dia mesmo…
O protesto dos garimpeiros contra o ICMBio incluía também áudios que circulam em grupos de WhatsApp, convocando empresários e demais mineradores para a porta do ICMBio contra as ações de repreensão ao crime, segundo reportou o “Estadão”. E olha que o ministro da Justiça, Anderson Torres, autorizou nesta semana o envio de agentes da Força Nacional de Segurança Pública para a região com a missão de combater o garimpo ilegal no Pará durante 30 dias. Resta saber quem irão proteger.
A destruição de máquinas, no entanto, é uma ação prevista em lei. A queima de equipamentos não apenas inviabiliza financeiramente o crime, como, em muitas ocasiões, é uma medida para garantir a segurança dos próprios agentes, dado que a remoção pode ser complexa e arriscada, com riscos de emboscada.
‘Caribe Amazônico’
A operação desta semana da PF foi batizada de Caribe Amazônico e realizada na região da terra indígena Munduruku.
Segundo a PF, a operação foi decorrente de informações sobre a contaminação do Rio Tapajós, que levaram à necessidade de ações imediatas nas regiões de Itaituba, Jacareacanga, Moraes de Almeida, Creporizinho e Creporizão. Participaram dessas ações cerca de 150 agentes do Estado dos seguintes órgãos: Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Força Nacional de Segurança Pública, Marinha, Exército, Força Aérea Brasileira, Bope PMDF, além do Ibama e Funai.
De acordo com informações divulgadas na terça-feira, 15/02, quatro pás caveiras e dois motores usados para bombear os sedimentos na extração do ouro foram inutilizados. Os equipamentos estavam sendo despejados nos igarapés que deságuam no Rio Tapajós, poluindo o rio.
Na semana anterior, a região havia sido alvo de outra ação da Polícia Federal. Na quarta-feira, 9/02, a PF realizou a Operação Alerta Amazônia 2, que teve como alvo o desmatamento ilegal que domina a Floresta Nacional de Altamira, no município de Itaituba, no Pará.
Ponte dourada Pará-Brasília
Enquanto PF e o Ministério da Justiça agem por um lado, o garimpo ilegal avança por outro totalmente divergente em direção a Brasília. E isso na mesma semana. Por exemplo, na segunda-feira, 14/02, o Diário Oficial da União publicou uma nota oficial que institui um novo programa de apoio à “mineração artesanal e em pequena escala”. A publicação foi assinada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), que trocou o nome de “garimpo” por “mineração artesanal”.
Trata-se de uma ação para apoiar a lavra garimpeira, principalmente na região amazônica, uma prática que é majoritariamente marcada pela extração ilegal de ouro e pedras preciosas.
Um dia depois, o decreto foi alvo de questionamentos no Congresso Nacional. Por meio de um projeto de decreto legislativo protocolado na terça-feira, 15, o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), acompanhado de todos os demais membros do partido, pediu a suspensão do ato de Bolsonaro.
Segundo Lopes, que é líder da bancada petista, o decreto presidencial institui uma série de medidas que, na prática, “poderão representar um aumento nas atividades potencialmente danosas de garimpagem na região” amazônica, com incentivo à mineração predatória e invasão de áreas protegidas.
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Fontes: PF, Estadão e Folha