Não é só nossa cobertura vegetal que é alvo da destruição. Uma vasta pesquisa publicada nesta quinta-feira, 5/05, apresentou dados da saúde de nossas águas com resultados preocupantes, embora parte dos paraenses vizinhos do Rio Tapajós, um dos dez rios mais ameaçados do mundo, por exemplo, viva já essa realidade há anos.
Das 11.216 microbacias da Amazônia no Brasil, 2.299 (20%) têm impacto considerado alto, muito alto ou extremo com base em nove fatores de pressão: agricultura e pecuária, área urbanizada, garimpo ilegal, mineração industrial, hidrelétricas, cruzamento de estrada, hidrovia, degradação florestal e diferença de precipitação. Você pode ver por aqui.
Os rios mais afetados são o Xingu, Madeira, Tapajós e Tocantins, envolvendo os Estados do Pará, Tocantins e Amazonas, e quase todos estão comprometidos por atividades como agropecuária (98%), construção de estradas (62%), hidrelétricas (50%), mineração (46%) e garimpo ilegal (2%).
“Conseguimos perceber que as águas da Amazônia estão bem menos protegidas do que imaginávamos. O impacto é bem disperso e atinge até mesmo áreas bastante isoladas. As atividades não acontecem sozinhas, mas em conjunto com outros fatores. Um impacto abre caminho para outros, como no caso das hidrelétricas. Elas demandam grandes infraestruturas e acabam proporcionando acesso para mais desmatamento, estradas, cruzamentos”, alerta Cecília Gontijo Leal, bióloga e pesquisadora da USP, principal autora do estudo Índice de Impacto nas Águas da Amazônia (IIAA), ao lado da editora de infografia da Ambiental, Laura Kurtzberg.
As cinco regiões com valor de índice mais alto são todas marcadas pela presença de barragens de grandes hidrelétricas, como Canaã, em Rondônia, e Belo Monte, no nosso Pará. Considerando todas as microbacias categorizadas como tendo impacto alto, muito alto ou extremo, 50% estão afetadas por hidrelétricas e 21% sofrem efeitos combinados de barragens e mineração industrial.
“A Bacia Amazônica é o conjunto de todos os rios, lagos e igarapés e não pode ser analisada separadamente. O efeito acumulativo dos impactos sobre ela é maior do que a soma dos fatores individualmente e é isso que o índice mostra: a sobreposição dos fatores de pressão em diferentes áreas da região”, complementa Cecília.
Para se ter mais noção da gravidade da situação, o Brasil perdeu cerca de 16% da superfície de água que possuía entre 1991 e 2020, o equivalente a 3,1 milhões de hectares, segundo o MapBiomas. O Pantanal teve redução de 74% da superfície de água, e a Amazônia, de cerca de 13%.
O território paraense é cortado por três importantes bacias hidrográficas (BH). Além da BH Amazônica, o Pará também está inserido na BH Tocantins Araguaia e o extremo nordeste do Estado na BH Atlântico Nordeste Ocidental.
Índios como guardiões
As terras indígenas e as unidades de conservação também são impactadas pelos fatores de pressão. Segundo o IIAA, das 385 terras indígenas existentes na Amazônia, 323 têm índice de impacto de médio para baixo, o que demonstra o papel fundamental dessas áreas na proteção dos ecossistemas aquáticos da Amazônia.
As 53 restantes (14%) têm índice de impacto alto, muito alto ou extremo. O IIAA também aponta que 23% das unidades de conservação na Amazônia estão altamente afetadas.
“Esses dados revelam que há um impacto significativo nesses territórios. Apesar disso, as áreas naturais constituem um dos mecanismos de defesa mais importantes para o manejo sustentável dos ambientes e devem permanecer protegidas”, ressalta Cecília.
O pesquisador Thiago B. A. Couto, associado à National Geographic Society e ao Instituto de Meio Ambiente da Universidade Internacional da Flórida, demonstrou que as pequenas hidrelétricas da Amazônia são responsáveis pela perda de conectividade dos rios, impedindo que peixes migradores completem seus ciclos de vida.
A construção do índice foi feita com base nos dados de ocorrência e distribuição das ameaças obtidos a partir de fontes públicas e gratuitas, entre elas, Projeto Mapbiomas, Rede Amazônica de Informação Socioambiental (RAISG) e Agência Nacional de Águas (ANA), além de dados extraídos de artigos científicos.
Trata-se de um alerta importante, pois as pequenas usinas correspondem a 80% do total das 275 hidrelétricas instaladas na Amazônia. Seu licenciamento é menos burocrático e elas estão menos expostas às polêmicas habituais dos grandes empreendimentos.
Na região do Madeira ao redor de Porto Velho, uma das maiores produtoras de ouro aluvial do mundo, muitos pescadores abandonaram a atividade e partiram para o garimpo, mais rentável e poluente.
Veja aqui sobre onde navega o nosso Pará. Para conhecer os dados completos do IIAA, acesse aqui.
Veja matérias do Para Terra Boa sobre mineração aqui.
Fonte: Instituto Serrapilheira e Ambiental Media