Já reparou que quando se fala em desmatamento na Amazônia, nunca aparecem os culpados com nome, endereço e CPF? Pois eles estão aí, impunemente. O que sabemos é que não se trata de, como se diz, peixe pequeno, mas bem graúdo, já que derrubar floresta é uma atividade ilegal milionária.
Enquanto o paraense dá suor e sangue na roça, o desmatador fatura milhões com a grilagem de terra roubada do poder público, pagando uma ninharia para que um desempregado qualquer, sem perspectiva de trabalho, receba uns trocados para fazer parte desse comércio ilegal.
O Pará Terra Boa reuniu algumas informações para dimensionar o impacto econômico dessa ilegalidade, muitas vezes relacionada com a expansão da pecuária em nosso Estado. Os pastos cobrem cerca de 90% das áreas desmatadas na Amazônia.
Atualmente, 4 de cada 10 cabeças de gado no Brasil estão na Amazônia Legal, sendo que a baixa produtividade predomina – em média, na área onde seria possível alimentar 33 animais, existem apenas 10 na Amazônia.
O desdobramento a fim de aumentar a produção parece um círculo vicioso em torno do desmatamento, e essa conta sai mais cara que reformar pastagens. Veja abaixo os dados:
Valor por hectare
Desmatamento ilegal, muitas vezes, inclui trabalho escravo, formação de quadrilha, grilagem, roubo de madeira entre outros desdobramentos. Isso tudo sem falar em tecnologia, equipamento e pessoal para derrubar madeira na floresta protegida.
Em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo” em 2019, o procurador Joel Bogo afirmou que o custo do desmatamento é de, no mínimo, R$ 800 por hectare, mas pode chegar a R$ 2 mil.
“Depende das condições. Se tem muitas motosserras, por exemplo, ou se usa correntão. Um trator esteira, para abrir os ramais (estradas), custa centenas de milhares de reais. Em um desmate no Acre de 180 hectares, o Ibama encontrou 35 pessoas trabalhando ao mesmo tempo. Em condições análogas à escravidão”, relatou ao jornal.
Hectare desvalorizado
O desmatamento produzido entre os anos de 2011 e 2014 deixou a terra brasileira mais barata e essa situação não favorece quase ninguém. Quase. O produtor que comprou novas terras após essa desvalorização contou com uma ajuda do desmatamento, mesmo que ele não tenha derrubado uma só árvore. O preço melhor da terra fez aumentar seu patrimônio e seu volume de produção, enquanto o desmatamento prejudicou produtores sem recursos, que tiveram suas poucas terras desvalorizadas.
Um exemplo é o preço das terras em São Félix do Xingu (PA), município com maior depreciação observada: foi de R$ 2.476/ha em 2017. Sem o desmatamento em anos anteriores, o hectare chegava a valer R$ 6.606.
A afirmação foi comprovada no estudo lançado em 17 de fevereiro de 2022 pelo Instituto Escolhas, feito por pesquisadores da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq/USP).
Reforma de pasto
A reforma de um pasto não sai por menos que R$ 2.982,18 por hectare, mas desmatar custa mais: investimento em maquinário, retirada de tocos de madeira e limpeza saem por, no mínimo, R$ 3 mil por hectare, segundo a Scot Consultoria em estudo encomendado pela WWF, Tropical Forest Alliance (TFA) e fundação Solidariedad.
Para reformar cerca de 100 milhões de hectares de pastos no País, os pecuaristas brasileiros precisariam investir entre R$ 127 bilhões e R$ 246 bilhões, dependendo do grau de devastação e do tipo de tecnologia usada. Essa recuperação de pastagens poderia liberar entre 22,3 milhões e 67,7 milhões de hectare, de acordo com o estudo.
Comparativo
Para atender a demanda por ganho de produtividade, sem desmatar novas áreas, seria necessário reformar 170 mil e 290 mil hectares de pasto degradado por ano até 2030, considerando as taxas de crescimento projetadas pelo Ministério da Agricultura (1,4% e 2,4%). Isso equivaleria a reformar somente entre 0,37% e 0,64% da área de pasto existente no bioma, com custo entre R$ 270 milhões e R$ 873 milhões.
O valor da reforma da pastagem chega a ser 72% menor que o custo de abertura de novas áreas por meio do desmatamento (R$ 270 milhões/ano contra R$ 950 milhões/ano, no cenário de crescimento mais conservador), de acordo com informações do pesquisador associado do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), Paulo Barreto.
Quando considerados somente o custo de derrubada da vegetação e o plantio de pasto, de fato, o desmatamento é mais atrativo: R$ 1,5 mil por hectare contra R$ 3 mil/ha para recuperação da pastagem. A conta, no entanto, não leva em consideração o custo global da atividade nem o custo ambiental associado.
Fontes: Climainfo, O Estado de S. Paulo, Amazônia 2030, G1 e ((o))eco
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